sexta-feira, 31 de março de 2017

RESENHA | Preacher #6: Guerra ao Sol





Garth Ennis e Steve Dillon voltam com tudo neste sexto volume de Preacher, uma das HQs mais violentas, bizarras e profanas lançadas na década de 90 pelo selo adulto Vertigo, da DC Comics. Nela acompanhamos as viagens do reverendo Jesse Custer - que divide o corpo com a entidade meio anjo, meio demônio chamada Gênesis, que lhe dá o poder da Palavra de Deus -, através do interior dos EUA, na companhia de uma matadora de aluguel fracassada e um vampiro irlandês beberrão, enquanto é perseguido por uma organização ultrassecreta que deseja provocar o Armagedom e estabelecer a Nova Ordem Mundial. Após um quarto volume constituído basicamente de histórias de origem e fillers, e um quinto com um enredo bem fraquinho, dessa vez temos uma história realmente com a cara de Preacher, e isto quer dizer que ela esbanja violência, nudez, palavrões e personagens bizarros em situações mais bizarras ainda.

Este encadernado começa com o especial Guerra Solitária, história de origem de ninguém menos do que o maior adversário de Jesse Custer: Herr Starr. Garth Ennis finalmente descortina o passado do vilão, narrando sua trajetória desde quando ele era um membro descontente do esquadrão de elite antiterrorismo alemão GSG 9, até se tornar o segundo em comando na hierarquia do Graal. Esta história nos ajuda a entender a motivação por trás dos atos de Starr, identificando precisamente o momento em que ele percebeu que precisava fazer alguma coisa para mudar o rumo que a humanidade estava seguindo. O problema é que, aparentemente, ele é o único capaz de levar a cabo tal missão, já que até mesmo no Graal ele enxerga um enorme potencial desperdiçado numa fé cega e ignorante, motivo pelo qual ele começa sua campanha soliária (que dá nome ao especial) para usurpar o lugar do Grande Pai. De quebra, também começamos a entender o porquê dele exibir tendências sexuais tão bizarras, o que o tornam um vilão incomum. Se por um lado ele parece tão ameaçador, quando o vemos entre 4 paredes com uma mulher é impossível levá-lo a sério. Este especial conta com a arte de Peter Snejbjerg, o qual consegue manter a qualidade estabelecida por Dillon para a obra. 

A Origem de Herr Star

Após este especial a história volta ao ponto em que o quinto volume terminou: Jesse indo encontrar um indígena no Monument Valley, que lhe fornece uma droga (peiote) capaz de fazer com que ele acesse as memórias de Gênesis e possa descobrir enfim o paradeiro de Deus. A história começa meio arrastada, com muita falação, principalmente entre o casal Jesse e Tulipa, que sempre que tem a oportunidade traz de volta a velha mágoa dele tê-la deixado para trás na França, e entre Tulipa e Cassidy, que no volume anterior declarara seu amor pela moça, plantando a semente da discórdia que causaria tantos problemas no futuro. Ao mesmo tempo, outras peças são movimentadas no tabuleiro para ocuparem suas devidas posições: Herr Star, que aqui demonstra até onde vai a influência do Graal dentro do governo dos EUA, e o Santo dos Assassinos, que vem em busca de respostas para seu passado.

Quando todas as peças finalmente estão em seus lugares ocorre a tal Guerra ao Sol que dá nome ao encadernado, e que guerra é essa, meu camarada! Mais uma vez Steve Dillon nos presenteia com um verdadeiro espetáculo visual, exibindo uma arte em perfeita harmonia com o roteiro mirabolante e espalhafatoso de Garth Ennis. Basicamente esta batalha possui todos os ingredientes da luta vista em Orgulho Americano: o Graal tentando capturar Jesse com todos os meios necessários, o Santo Alargando chumbo nos soldadecos, e o grupo de Jesse no fogo cruzado; a única diferença é que a batalha acontece em campo aberto, ao invés do castelo de Massada. Até aí nenhuma novidade, embora um pouco de ação, tiros e tripas esvoaçando não façam mal a ninguém; mas desta vez há uma nova peça no tabuleiro: Tulipa. E a moça não deixa a desejar ao esbanjar seus incríveis talentos como exímia atiradora, e mais uma vez a vida de Jesse depende da pontaria infalível do seu grande amor.

Tulipa "Largando o Aço" nos Soldados do Graal

Ao final do conflito ocorre uma grande reviravolta no roteiro, e mais uma vez Garth Ennis prova que, por mais absurda seja a situação que ele coloque seus personagens, ela sempre pode piorar mais. Starr, que já havia perdido uma orelha e ganhado uma horrível cicatriz na cabeça, agora tem que lidar com a perda de mais uma parte de seu corpo, e da maneira mais grotesca. Tal perda, no entanto, só serve para alimentar ainda mais seu ódio por Jesse.

Quanto ao pastor, o final deste encadernado marca o cisma que finalmente põe um fim à divertida parceria entre Jesse e Cassidy, quando o vampiro finalmente mostra as suas presas (perdão pelo trocadilho) e revela o quão sádico e egoísta ele pode ser. Mas se Jesse perde um amigo, logo após ele ganha um mais fiel, um de quatro patas, que faz sua introdução na última edição. Além de tudo isso, Garth Ennis ainda tem tempo para desenvolver o arco do Cara de Cu, que começa a descobrir o preço da fama.

Guerra ao Sol aproxima a missão de Jesse ainda mais de seu final épico, mas Garth Ennis ainda tem algumas histórias para contar antes de aposentar o irreverente pastor. A pergunta é: por tudo que Jesse tem passado até então, será que essa busca ainda valerá a pena? Não percamos os próximos desenvolvimentos! Assim como os demais volumes, esta HQ foi publicada pela Panini Books, em capa dura e papel couchê.

Boa diversão!

Capa de Preacher: Guerra ao Sol, por Glenn Fabry

terça-feira, 28 de março de 2017

RESENHA | Mulher Maravilha: Deuses e Mortais



É praticamente impossível falar da Mulher Maravilha unicamente no contexto das histórias em quadrinhos, quando ela é muito mais do que isso: Diana Prince é simplesmente a primeira e maior super heroína de todos os tempos; ela é um ícone cultural, um símbolo do movimento feminista, inspiração para todas as mulheres do mundo que desejam ser livres, autênticas e independentes. Ela foi criada em 1941 pelo psicólogo William Moulton Marston, famoso pela invenção do polígrafo - a versão real do Laço da Verdade -, como uma alternativa aos heróis masculinos que predominavam nos quadrinhos. Até então, as personagens femininas dessas histórias não passavam de mocinhas ingênuas que precisavam ser resgatadas ou preocupadas matronas responsáveis por costurar os uniformes dos filhos heróis. Com o surgimento de uma super heroína capaz de lutar em pé de igualdade com qualquer personagem masculino, Marston acreditava mandar uma mensagem para todas as meninas dos EUA de que elas não eram inferiores aos homens, de que elas eram capazes de conquistar os direitos que lhes eram negados, como votar, escolher qual carreira seguir, ou ocupar cargos de liderança em grandes companhias.

Ao lado do Superman e Batman, a Mulher Maravilha constitui um dos três pilares principais da DC Comics. Sua revista foi publicada ininterruptamente desde a década de 40 até 1887, quando sobreveio o fatídico reboot dos títulos da editora, sob o pomposo título Crise nas Infinitas Terras. Com a Crise todos os diversos universos paralelos, com suas diversas linhas temporais e versões alternativas dos heróis, foram eliminados da cronologia, e roteiristas de renome foram convocados para reformular os principais heróis da editora. Frank Miller criou o aclamado Ano Um do Batman, enquanto John Byrne revitalizava o mito do Superman em O Homem de Aço. Coube a George Pérez assumir o legado da Mulher Maravilha e criar uma história de origem completamente nova e atualizada para a Princesa das Amazonas, que havia morrido pelas mãos do Antimonitor nas últimas páginas da Crise. O resultado, o arco de histórias intitulado Deuses e Mortais (Mulher Maravilha v2, 1-7), foi uma das fases mais aclamadas da Mulher Maravilha, e que até hoje serve de base e inspiração para todos os escritores que passam pela revista solo da Princesa Amazona.

O Nascimento da Mulher Maravilha

George Pérez manteve os elementos principais da história de Diana, os quais remontam até sua crianção por W. M. Marston: a Ilha Paraíso, as amazonas, o piloto Steve Trevor, o torneio para decidir quem o levaria de volta ao "mundo do patriarcado", o laço da verdade. Outros aspectos sofreram alterações, como a Mulher Maravilha ser capaz de voar, o que tornou dispensável o icônico Avião Invisível. A Mitologia Grega consiste em uma das principais inspirações de Pérez para sua visão da amazona. Os deuses do Olimpo não apenas existem, mas interferem nas vidas dos personagens, seja para o bem (concedendo os poderes da Mulher Maravilha) ou para o mal (fomentando o ódio e a violência nas mentes dos líderes militares do planeta).

O apelo feminista da personagem, que é o principal legado de W. M. Marston, não é deixado de lado por Pérez, que, em plena década de 80, quando a expressão "empoderamento feminino" ainda não era utilizada, constrói um enredo repleto de personagens femininas fortes, como a Drª. Julia Kapatelis e a simpática e gorducha Etta Candy, e recheada de simbolismos, como a ideia de as amazonas sempre portarem seus braceletes como lembrança do período em que foram escravas dos homens. O próprio vilão escolhido para esta saga, Ares, o Deus da Guerra da Mitologia Grega, encarna características predominantemente masculinas - dominação pela força, ódio e violência (o que não quer dizer que todos os homens sejam assim) - que contrastam com o clamor por justiça, o amor e o carinho tão particulares às mulheres (o que não quer dizer que todas as mulheres sejam assim).

Ares, o Deus da Guerra

O roteiro de Deuses e Mortais é simples e eficiente, e a arte refinada e repleta de detalhes de George Perez é espetacular. Esta é sem dúvida a origem definitiva da Mulher Maravilha, e olha que eu conheço pelo menos mais três por aí (Terra Um, Novos 52 e Rebirth), mas todas elas são apenas releituras atualizadas de Deuses e Mortais. Com o filme solo da Mulher Maravilha estreando em junho deste ano, esta HQ é uma ótima pedida para quem quer conhecer mais a história da Princesa das Amazonas nos quadrinhos.

Mulher Maravilha: Deuses e Mortais está sendo publicado pela Panini Comics na série Lendas do Universo DC: Mulher Maravilha Vol. 1, com capa cartão e papel offset; mas quem deseja ter este material em edição de luxo também pode aguardar um pouco mais, pois ele faz parte da coleção de Graphic Novels DC da Eaglemoss, se eu não me engano na edição 38. Boa leitura!


domingo, 26 de março de 2017

O que eu achei do trailer de LIGA DA JUSTIÇA?



Finalmente saiu o tão aguardado trailer de Liga da Justiça, filme da DC/Warner que reunirá pela primeira vez os maiores heróis da editora contra uma poderosa ameaça vinda do espaço. O longa está previsto para estrear no dia 16 de novembro de 2017, segundo o calendário divulgado pela própria Warner. Sendo um dos filmes mais aguardados pelos fãs de quadrinhos, eu não poderia deixar de falar o que achei do trailer, e sobre alguns detalhes que me deixaram bastante intrigado. Antes, porém, para quem ainda não viu, segue o trailer propriamente dito, e a sinopse do filme. 



Movido por sua fé restaurada na humanidade e inspirado pelo sacrifício do Superman, Bruce Wayne conta com a ajuda de sua nova aliada, Diana Prince, para enfrentar um inimigo ainda maior. Juntos, Batman e Mulher Maravilha trabalham rápido para encontrar e recrutar uma equipe de meta-humanos para se opor à nova ameaça. Mas apesar da formação dessa liga de heróis sem precedentes - Batman, Mulher Maravilha, Aquaman, Flash e Ciborgue - pode ser tarde demais para salvar o planeta de um ataque de proporções catastróficas.

Vamos aos comentários!

Primeiro de tudo, gostaria de salientar que estou me esforçando ao máximo para não criar muitas expectativas acerca deste filme. O motivo é óbvio: ano passado tivemos duas bombas atômicas cinematográficas seguidas da DC/Warner, que atendem pelos nomes de Batman Vs. Superman: A Origem da Justiça e Esquadrão Suicida. Ambos elevaram o hyppe dos fãs aos máximo com trailers muito bem editados, mas acabaram dando um banho de água fria na maior parte dos fãs quando estrearam. Os principais quesitos que levaram ao fisco de ambos foram uma péssima edição, tom mal empregado e, principalmente, falhas de roteiro. Além disso, Liga foi dirigida por Zack Snider, mesmo diretor de BvS, e co-responsável pelo desastre do ano passado. Contudo, eu gosto de algumas obras do Snyder, como Homem de Aço e Watchmen, e ainda acredito que ele tem tudo para fazer um grande filme (se os roteiristas e editores não tiverem feito m** de novo!)


Passando para o trailer propriamente dito, ele começa nos mostrando Bruce Wayne chegando a uma região costeira, gelada e inóspita, parecida com o Alasca ou algum país nórdico da Europa. É lá onde vive Arthur Curry (Jason Momoa), o Aquaman, que nos quadrinhos é o herdeiro do Trono de Atlântida, sendo um mestiço humano/atlante. O filme deve seguir mais ou menos por esta linha, mas retrata o herói como um homem amargurado que afoga suas mágoas no álcool, mas que ainda consegue utilizar seus poderes para o bem. No trailer vemos o herói salvar um homem (provavelmente Bruce Wayne) dos mares revoltos.


A origem do Ciborgue (Ray Fisher) muito provavelmente será retratada no filme, até porque temos vislumbres do herói cibernético antes de sofrer o trágico acidente que o deixou desmembrado, quando ele ainda era um jogador de futebol americano. O trailer também apresenta seu pai, o Dr. Silas Stone, vivido por Joe Morton, e uma Caixa Materna, que é uma espécie de computador vivo que serve aos chamados Novos Deuses. Conforme foi visto em BvS, é essa caixa a responsável pela transformação de Victor Stone no Ciborgue.


A seguir vemos novamente a cena do encontro entre Bruce Wayne (Ben Affleck) e Barry Allen (Ezra Miller), que nas horas vagas atua como o Flash. Não tem como não comparar esta cena com aqiela em que Tony Stark se encontra com Peter Parker em Capitão América: Guerra Civil. Assim como Barry, mais uma vez a Warner chegando atrasada! Além desta cena também aparecem outras com o Flash em ação, vestindo seu um uniforme que mais parece uma armadura. Após isso vemos a (re)apresentação do Batman de Ben Affleck, numa cena de ação no melhor estilo do Homem Morcego: se balançando numa batcorda e jogando uma batbomba em um parademônio de Apokolips.

Após isso somos apresentados à equipe inteira, com a voz da Mulher Maravilha ao fundo declarando o retorno da Era dos Heróis, numa clássica analogia com os heróis da Mitologia Grega. Essa foi uma das partes do trailer que me deixaram mais extasiado, pois os heróis da DC sempre foram vistos pela editora e pelos fãs como seres muito superiores que os humanos, quase como semideuses, entidades que vigiam o planeta do alto.

O trailer continua mostrando uma sequência de impressionantes cenas de ação, focando nos heróis que ainda não apareceram pra valer nos filmes anteriores: Aquaman, Ciborgue e Flash. Em quase todas as cenas os escolhidos para servirem de sacos de pancada são os parademônios de Darkseid, que aqui aparecem retratados com bastante fidelidade às suas contrapartes dos quadrinhos.




O trailer prossegue mostrando várias cenas focadas naquele que provavelmente será o líder dessa Liga: o Batman. Curiosamente, é dele uma das cenas mais engraçadas do trailer, quando o Flash lhe pergunta qual o seu super poder e ele responde secamente: "Sou rico." E isso resume 100% a essência do personagem: ele pode fazer o que quiser, até mesmo reunir os maiores heróis do mundo, simplesmente porque tem rios de dinheiro pra bancar isso tudo! Outra novidade do trailer é a aparição do Crawler, o novo brinquedinho do Cavaleiro das Trevas: um veículo fortemente armado dotade de quatro pernas mecânicas. 


Uma grata surpresa é a aparição de Mera, a mulher do Aquaman, tão badass quanto o marido. Ela aparece entre dois soldados atlantes (pena que não dá para ver detalhadamente suas armaduras, mas pelo que dá pra ver estão incríveis) e aparentemente protegendo uma das Caixas Maternas, provavelmente aquela em poder dos Atlantes. Conforme já foi divulgado, há 3 Caixas Matenras na Terra: uma em poder dos humanos (certamente a que está com o Ciborgue), outra com Atlântida e a última com as Amazonas. Muito provavelmente essas caixas fornecerão uma explicação mais racional para os poderes dos atlantes e das amazonas. Assim como foi feito com o Thor da Marvel, a questão dos deuses será explicada pela tecnologia. A cena abaixo mostra uma batalha entre as amazonas (ou talvez suas ancestrais) e os parademônios numa planície deastada, e eu suponho que seja um fashback da origem das Amazonas, mostrando como elas obtiveram sua Caixa Materna. Tal informação deve ser dada pela Mulher Maravilha, que reconhecerá o artefato sob a posse do Ciborgue ou de seu pai. 

 


Outra cena mostra um pouco da história do Flash. Vemos o rapaz falando com um homem em um presídio que deve ser seu pai. Nos quadrinhos, o pai de Barry Allen é injustamente acusado do assassinato da esposa. 


 

Mais cenas de ação são mostradas, as mais legais envolvendo o Batman e seu novo e aprimorado Batmóvel. É bastante óbvia a inspiração do visual deste veículo com o empregado no jogo Batman: Arkham Knight. Logo depois vemos o trio MM, Araman e Ciborgue entrando em uma espécie de base alienígena, ou talvez no interior de una espaçonave (embora eu ache improvável que os invasores cheguem à Terra em espaçonaves; acho que será mais como no primeiro arco da Liga nos Novos 52, quando os invasores chegam em Boom Tubes (que nos quadrinhos são portais interdimensionais produzidos pelas Caixas Maternas).

O trailer se aproxima do final com a clássica cena com Batman no telhado com o Comissário Gordon (J. K. Simons), mencionando o fato do Batman ter "voltado a trabalhar em equipe". Mais uma vez fica claro para os fãs que no passado o Batman do DCU já teve uma Batfamília. No final temos uma divertida cena mostrando o Aquaman na "garupa" do Batmóvel preparando-se para atacar mais alguns pobres coitados parademônios. Isso mostra o quanto a DC/Warner está disposta a inserir humor em suas novas produções, em respostas às críticas dos fãs ao tom excessivamente sombrio de BvS.

 
 


Então é isso! O trailer acaba, sem, contudo, mostrar grandes segredos do filme, o principal deles o retorno do Superman (Henry Cavill) e eu queria muito, mas muito mesmo, que continuasse assim. Uma das grandes falhas de BvS foi justamente o fato de os trailers terem entregado praticamente a história inteira do filme, tirando toda a surpresa que aquelas cenas iriam causar caso não tivessem sido previamente divulgadas. Infelizmente essa tem sido uma prática comum aos grandes estúdios, até mesmo na concorrência: foi broxante o trailer de Guerra Civil ter mostrado a primeira aparição do Homem Aranha.

A aí, animado para o filme? Caso tenha notado mais alguma coisa que eu não reparei ou tenha uma nova teoria sobre a história por trás de Liga da Justiça, não deixe de comentar! 

quarta-feira, 22 de março de 2017

RESENHA | A Torre Negra, Livro 2: A Escolha dos Três


Leitura Prévia:
"E a Torre está mais próxima."

Assim termina o segundo livro da saga A Torre Negra, mais famosa antologia do escritor norte-americano Stephen King. Apesar do otimismo do autor, a verdade é que neste segundo passo da busca de Roland, o último pistoleiro do Mundo Médio, pela mística Torre Negra, a verdade é que há pouco avanço neste sentido. Todo o enredo de A Escolha dos Três se resume à missão de Roland em recrutar companheiros para auxiliá-lo nesta busca; os mesmos companheiros que haviam sido profetizados num jogo de tarô pelo Homem de Preto ao final de O Pistoleiro - primeiro livro da saga. São eles: o Prisioneiro, a Dama das Sombras e a Morte. O pistoleiro vai de encontro a eles através de portais que são abertos unicamente para ele ao longo de uma praia no litoral oeste de seu mundo. Estes portais, na forma de portas comuns de madeira, conectam o mundo de Roland com o nosso mundo, mais especificamente com a cidade de Nova York, em diferentes épocas.

Se em O Pistoleiro era notável a diferença da escrita de King em relação às suas demais obras (lembre-se que ele escreveu O Pistoleiro quando ainda tinha 19 anos), em A Escolha dos Três ele está em sua melhor forma. Sua escrita é fluida, dinâmica, envolvente; King parece conversar com o leitor, ao invés de simplesmente contar uma história. Seu maior talento, contudo, reside na criação de personagens: nenhum deles é raso e unidimensional; cada personagem que surge na trama é dotado de um traço de personalidade próprio e uma história de vida única, mesmo aqueles considerados secundários para a trama (é impossível não sentir pena do dono da farmácia ou da dupla de policiais que cruzam o caminho de Roland durante o terceiro ato). Merecem destaque os três (ou quatro) principais da trama: o próprio Roland, o viciado em heroína Eddie Dean, e Odetta Holmes, uma ativista dos direitos dos negros paralítica e que sofre de dupla personalidade. 

Eddie é o Prisioneiro, e num primeiro momento associamos sua "prisão" como sendo a dependência química que ele tem da heroína; no entanto, conforme Stephen King nos revela mais sobre seu passado, percebemos que seu cativeiro é ainda mais complexo, e está ligado à relação com o irmão Henry Dean, o "eminente e sábio viciado". Mas é Odetta Holmes, a Dama das Sombras, quem realmente rouba a cena neste livro, mais especificamente sua contraparte psíquica, a maligna, pervertida Detta Walker. Enquanto toda bondade ficou concentrada na primeira, Detta herdou todos os traços negativos da personalidade de Odetta. O mais incrível sobre esta personagem é que cada uma das metades desconhece a existência da outra, e toda vez que elas trocam de lugar seu subconsciente inventa uma história sobre o que teria acontecido em sua "ausência", de modo que ela não sofre com períodos de amnésia comuns a pessoas que têm este tipo de quadro psicológico. Odetta/Detta ainda sofre com um grave problema físico: quando jovem ela teve metade das duas pernas decepada em um acidente de trem, que na verdade não foi um acidente. Mas não pense que, sendo paraplégica ela é inofensiva: assim como uma serpente, mesmo se arrastando ela consegue ser a criatura mais ardilosa do livro, e dá muito trabalho para os brancos putos Eddie e Roland. King aproveita a história de Odetta/Detta para tocar na questão dos problemas raciais pelos quais os negros norte-americanos passaram durante as décadas de 50 e 60, tema recorrente de outras obras do autor, como o livro It.

Eddie e Odetta/Detta

Além de recrutar novos membros para seu ka-tet (palavra no idioma do Roland para definir um grupo de pessoas unidos por um mesmo destino), Roland precisa lidar com seus próprios, e tão urgentes quanto, problemas. Logo no prefácio deste livro, King toma uma decisão que me deixou completamente estarrecido. Roland - outrora o maior de todos os pistoleiros -, tem os dois primeiros dedos da mão direita decepados pelas lagostrosidades, umas criaturinhas parecidas com lagostas que habitam a praia onde a história se desenrola. Quando isto aconteceu eu pensei: pronto, agora o cara conseguiu ferrar de vez com a melhor característica do seu protagonista, que é justamente de ser um grande atirador! Felizmente, o pistoleiro ainda consegue atirar com a mão esquerda, e mesmo doente (além de tudo o mais suas feridas começam a gangrenar) ele ainda consegue ser um dos mais mortais atiradores que eu já tenha ouvido falar, haja vista a cena insana do tiroteio no restaurante do narcotraficante Enrico Balazar, a qual não tem como deixar de comparar com as cenas dos filmes do Quentin Tarantino.

A Escolha dos Três é quando realmente a história d'A Torre Negra começa, não apenas por ser o livro que ditaria o ritmo e o estilo de escrita de todos os demais da saga, mas porque ele apresenta os personagens centrais desta grande trama que só começará a se desenrolar a partir do próximo volume. A Torre Negra foi publicada aqui no Brasil pelas editora Suma de Letras e Ponto de Leitura, e pode ser encontrada facilmente nas principais livrarias do país.

Boa leitura!

quinta-feira, 16 de março de 2017

O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel | Ilustrações por Jian Guo




J. R. R. Tolkien foi um dos maiores escritores do século passado, e suas fantásticas histórias, repletas de hobbits, anões, elfos e orcs até hoje povoam a imaginação de milhões de pessoas, de todos o sexos e idade, além de terem influenciado inúmeros outros escritores. Antes que os filmes dirigidos por Peter Jackson fossem uma realidade (o filme animado de 1978 definitivamente não conta!), um caminho alternativo aos livros para imergir no universo da Terra Média era através das ilustrações de alguns desenhistas que se arriscavam a dar vida a alguns dos principais momentos dos livros - sem contar o próprio Tolkien, que chegou a dar as suas rabiscadas. 

Mesmo após o lançamento dos filmes, eu sempre gostei de pesquisar por ilustrações do universo tolkeniano em busca de visões alternativas à de Jackson. Conheci as belas pinturas de Ted Nasmith; os desenhos de John Howe, que inspiraram muito do visual dos filmes; e as incríveis telas de Alan Lee. Espero um dia postar algumas dessas maravilhosas artes, mas nesta postagem resolvi mostrar algumas gravuras que eu achei por acaso navegando pelo site DeviantArt

A autoria dos desenhos é do chinês Jian Guo, que exibe um estilo bastante peculiar, que foi o motivo pelo qual amei de cara seus desenhos: eles exibem traços grossos, cores exuberantes, e muitas vezes não representam apenas uma cena específica do livro, mas toda uma sequência de cenas, que qualquer leitor de O Senhor dos Anéis não teria dificuldade de reconhecer. 

Agora chega de falação e vamos aos desenhos propriamente ditos. Lembrando que nesta postagem só colocarei as ilustrações relativas ao primeiro livro: A Sociedade do Anel. Descrições nas legendas. 


Os Anéis de Poder: 3 Anéis para os Elfos,
7 para os Anões, 9 para os Homens e
Um Anel para a Todos Governar


A Trajetória do Anel: da Mão de Sauron
para Isildur; a Traição do Anel;
e o Achado de Sméagol


Bilbo Bolseiro Dá uma Festa no Condado


A Estalagem O Pônei Saltitante, em Bree;
o Encontro com Passolargo; os Nazgûl Espreitam
os Hobbits


O Topo do Vento: Frodo é Ferido por uma
Faca de Morgul; Aragorn Enfrenta os Espectros do Anel


O Vau de Buinen: Enrond Conjura o Feitiço
que Salva Frodo dos Nazgûl


Minas de Moria: o Portão Oeste; o Vigia na Água; 
Emboscada de Goblins; O Balrog


Gandalf e o Balrog


Lothlórien: Frodo Olha no Espelho de Galadriel; a Sociedade
 Recebe Presentes da Senhora dos Elfos; Gandalf Luta com
o Balrog no Topo da Montanha


Despedida: A Sociedade do Anel Deixa Lothlórien
e Desce o Rio Anduin Rumo a Gondor


Portões dos Argonath: a Sociedade É Emboscada;
Boromir é Morto; Merry e Pippin São Capturados

terça-feira, 14 de março de 2017

RESENHA | THOR: Ragnarok


Mitologia é um conceito bastante explorado no mundo dos quadrinhos, devido ao seu grande repertório de divindades, heróis e criaturas fantásticas. Há quem considere os heróis atuais versões modernas para os heróis da antiguidade, e se pararmos para pensar um pouco sobre o assunto constatamos que isto faz todo sentido. Na antiguidade o mito de divindades e heróis, os quais, assim como hoje, eram seres humanos com capacidades excepcionais, era disseminado através de histórias, muitas vezes contadas de forma oral, embora diversos registros escritos tenham sobrevivido ao passar dos séculos. A única diferença é que hoje há uma maior facilidade para a propagação dessas histórias, e diversos meios para fazê-lo: os quadrinhos são apenas um deles; outros meios são os livros, filmes, animes, etc. Talvez os exemplos mais icônicos da influência da mitologia nos quadrinhos sejam a Mulher Maravilha, na DC Comics, e o Thor, um dos principais super heróis da Marvel Comics. É sobre este último que eu gostaria de falar na resenha de hoje.

Na mitologia nórdica, Thor é o deus do trovão, filho de Odin, o "Pai de Todos". Ele é conhecido por empunhar o martelo Mjolnir, capaz de destruir montanhas. Sem que muitas pessoas saibam, este deus nórdico é reverenciado até os dias atuais, tendo seu nome associado ao terceiro dia da semana, que em inglês é Thursday (Dia de Thor!).  Em 1962 os roteiristas Stan Lee (aquele mesmo velhinho que costuma aparecer nas cenas pós créditos dos filmes da Marvel) e Larry Lieber, juntamente com o desenhista Jack Kirby (outra lenda das HQs) transportaram Thor do mito para os quadrinhos, transformando-o em um super herói com viés de divindade. Ele estreou nas páginas da 83ª edição da revista Jorney Into Mistery , na qual o deus do trovão trocava de corpo com o médico Donald Blake toda vez que este batia sua bengala de madeira no chão. Ele também seria um dos membros fundadores da superequipe Vingadores, à qual ele é filiado até os dias atuais. Stan Lee e Kirby foram responsáveis por ampliar e consolidar o universo de Thor nos quadrinhos, trazendo para as páginas da revista diversos elementos da mitologia nórdica, como Asgard, Odin, o irmão maléfico de Thor, Loki, Balder, Lady Sif, dentre outros. Muitos roteiristas os sucederiam, construindo sobre os alicerces que eles estabeleceram; alguns com êxito, como Walt Simonson, responsável por uma das fases mais adoradas pelos fãs; já outros não conseguiram lidar com este grande legado e entregaram histórias fracas. Foi justamente após um destes ciclos de histórias ruins, marcado por uma grande baixa das vendas da revista, que a Marvel decidiu cancelar de vez o título do Thor. Em 2004, pegando carona na saga A Queda, que marcou o fim (temporário) dos Vingadores, Michael Avon Oeming e Daniel Berman escreveram Thor: Ragnarok, uma história que tinha como objetivo dar um fim digno a Thor e a todos os habitantes de Asgard.

A Grande Batalha do Ragnarok

Ragnarok significa "O Crepúsculo dos Deuses" e é a versão nórdica para o Apocalipse cristão (inclusive alguns historiadores acreditam que o Ragnarok tenha sido inspirado na escatologia cristã). Ele possui algumas variações, mas basicamente trata-se de como ps inimigos dos deuses se aliam para situar Asgard. Os deuses são convocados para a batalha pela trombeta de Heimdall, e neste confronto quase todos perdem a vida: Odin tomba diante de Fenrir - um monstruoso lobo filho de Loki -, mas é vingado por seu filho Vidal; Thor cai após matar Jormungand, a grande serpente, também filha do deus da trapaça; e Heimdall e Loki matam um ao outro em batalha. No fim Surtur, rei dos gigantes de fogo, queima o mundo inteiro, mas a Terra ressurge após um tempo, e é repovoada pelos humanos e deuses sobreviventes. Este é o Ragnarok conforme a mitologia, porém Oeming e Berman aproveitaram poucos elementos dessas histórias.

A HQ começa mostrando o plano de Loki para finalmente destruir os deuses e governar Asrgard: ele se alia ao gigante de fogo Surtur e consegue replicar o Mjolnir. O deus da trapaça distribui essas novas armas para seus asseclas e faz um ataque avassalador a Thor e seus amigos. Com esta vantagem ele rapidamente espalha a destruição ao longo dos nove reinos, e finalmente consegue realizar seu maior intento. Apesar de ser uma das partes favoritas dos fãs, principalmente daqueles aficionados pela mitologia nórdica e pela cultura medieval, enfim, fãs de O Senhor dos Anéis, para mim esta primeira parte é uma das piores fases do arco. Tudo acontece muito rápido e sem muitas explicações. A conquista de Asgard não é nem sequer mostrada, nem a morte de Balder - estes acontecimentos, que renderiam ótimas imagens pelo lápis da desenhista Andrea Divito, são apenas mencionados em diálogos. Ao invés disso, os autores resolvem trazer os Vingadores para a história, de maneira gratuita e desnecessária, apenas para depois dispensá-los sem qualquer motivo concreto. A impressão que se tem é que eles somente apareceram para ajudar a dar uma turbinada nas vendas da HQ, através da associação do arco com a famosa equipe da Marvel. Outro ponto negativo é a grande quantidade de personagens: os autores resolveram homenagear cada personagem que já passou pela revista do deus viking e lhes dar algum tipo de conclusão, a exemplo do que Alan Moore fizera na despedida do Homem de Aço pré-crise. Isto acaba acarretando uma certa dificuldade de entendimento da história para aqueles que não conhecem a fundo a mitologia do Thor dos quadrinhos.

O Ataque de Loki

A trama começa a melhorar lá pelo final da quarta edição de Ragnarok, quando Thor decide trilhar o mesmo caminho que seu pai Odin seguira em busca de sabedoria. Neste ponto a história se aventura pela natureza mitológica do personagem, com sua viagem às raízes da árvore Yggdrasil, onde fica o Poço de Mimir, local em que ele precisa fazer um sacrifício ainda maior do que seu pai para obter o poder de impedir a ruína dos deuses. No entanto, a história sofre uma grande reviravolta, que muda completamente a perspectiva do herói acerca do Ragnarok: a real ameaça aos deuses é revelada, e Thor, que antes queria impedir o evento, agora precisa levá-lo à cabo até sue final.

Thor: Ragnarok é uma história bem mediana, com um roteiro vacilante, feito de bons e péssimos momentos. O que realmente salva nesta história é a arte de Andrea Divito. A artista italiana usa de abusa de splash pages, e seu estilo de desenho se encaixa perfeitamente na pegada fantástica que inspirou o roteiro de Oeming e Bernan. Basta reparar no Thor que ela desenha, mais Parecido com um guerreiro saído direto de um jogo de RPG.

Recomendo esta HQ apenas para título de curiosidade quanto a esta fase do herói, mas se o objetivo é tentar antecipar alguma coisa da trama do próximo filme do deus do trovão nos cinemas, que possui título homônimo a esta trama, já vou logo avisando que ela não foi inspiração para o roteiro do longa, o qual, pelo que tudo indica, bebe da fonte de histórias mais atuais do Thor, como O Indigno Thor, e também da saga Planeta Hulk. Boa leitura!


domingo, 12 de março de 2017

RESENHA | A Torre Negra, Livro 1: O Pistoleiro



A Torre Negra é uma das obras mais importantes da carreira do escritor norte-americano Stephen King, por diversas razões: seja pelo tempo que ele levou para pô-la no papel - foram 33 anos entre o primeiro e o último livro -, ou pelo tamanho da obra em si, que conta com 7 volumes e um tie-in, a verdade é que o próprio escritor a considera sua obra prima. Ela é, também, a sua obra mais pessoal: no ano de 1999 Stephen King quase morreu ao ser atropelado por uma minivan enquanto caminhava nos arredores de sua casa de veraneio, e ele resolveu abordar este assunto em um dos livros da Torre Negra, inserindo a si próprio como personagem da obra. Há quem considere esta uma atitude egocêntrica e narcisista, outros até mesmo corajosa, entretanto, polêmicas à parte, a verdade é que ele conseguiu criar um épico de fantasia moderna que arrastou milhões de leitores para se juntar ao último pistoleiro, Roland Deschain, e seu ka-tet (aqueles unidos pelo destino) em sua busca pela famosa Torre Negra. Muitas foram suas inspirações para construir este vasto e complexo universo: o poema inglês Childe Roland to the Dark Tower Came ("Childe Roland à Torre Negra Chegou"), de Robert Browing, é uma delas, assim como as lendas arturianas, o cinema western, O Mágico de Oz, e até mesmo a trilogia O Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien - tudo isto em meio a inúmeras referências à cultura pop do século XX. Outro aspecto interessante desta série literária é que ela faz menção a personagens, lugares e até acontecimentos de diversos outros livros de King, criando um espécie de amálgama que une todas as suas obras em único e coeso Multiverso.

Toda grande jornada tem um começo, e o começo da busca de Roland pela Torre Negra se dá em O Pistoleiro, livro escrito em 1970, quando Stephen King tinha apenas 19 anos (grave este número, pois ele tem uma importância cabalística para a série e também para o próprio King) e publicado em cinco partes na revista The Maganize of Fantasy & Science Fiction entre 1978 e 1981. Apenas em 1982 esta história seria publicada como um livro único. Justamente por ter sido escrito bem no início da carreira de Stephen King, uma das peculiaridades deste livro é a forma da escrita de King, que difere bastante de outros trabalhos do autor, de modo que quase não dá para perceber que estamos lendo uma de suas histórias. O próprio autor declara em sua introdução que ele só viria a encontrar a sua "voz" para obra a partir do segundo livro, e é o que realmente acontece: é clara a diferença dos textos de um livro para o outro. No entanto, isto não faz este um livro ruim, apenas diferente.

Roland e a Torre Negra, pelo Ilustrador Michael Whelan

A história de O Pistoleiro, bem como grande parte da série A Torre Negra, se passa em um universo alternativo - ou num possível futuro do nosso (isso não fica muito claro) -, em que tudo está em decadência, inclusive a humanidade, a qual perdeu quase toda sua capacidade criativa e tecnológica, provavelmente como consequência de um holocausto nuclear. É o que o protagonista e diversos outros personagens chamam de "o mundo seguiu adiante". No crepúsculo deste mundo prosperou o reino de Gilead, último bastião da humanidade contra o caos e a deterioração que contaminaram o mundo. Este reino era protegido pelos pistoleiros, uma ordem semelhante a dos cavaleiros da Idade Média, porém ao invés de espadas eles portavam pistolas. Mas mesmo Gilead caiu, graças, em grande parte, à atuação do feiticeiro conhecido por vários nomes: Marten, Walter das Sombras, ou, mais comumente, apenas O Homem de Preto. Pouco se sabe sobre ele, apenas que "o homem de preto fugia pelo deserto, e o pistoleiro ia atrás."

É com esta fatídica frase que Stephen King abre o primeiro livro, e ela resume perfeitamente seu enredo: trata-se da perseguição de Roland ao Homem de Preto através de um escaldante deserto e pelos túneis sob as montanhas em busca de respostas acerca da mítica Torre Negra. Stephen King não faz nenhum tipo de introdução inicial sobre o universo de Roland, jogando o leitor diretamente no meio da história, o que causa uma certa confusão no começo. Mas aos poucos as coisas vão se ajustando, as respostas vão vindo e logo, sem perceber, o leitor está completamente envolvido pela busca do pistoleiro, ansiando pelo encontro entre Roland e o Homem de Preto, quando as respostas para várias perguntas são reveladas, e outras tantas perguntas são criadas. O diálogo final entre os dois antagonistas é impressionante, por levantar questões bastante profundas que fazem a pessoa refletir por horas e horas. 

A melhor parte desta história, contudo, é a relação entre Roland e o garoto Jake Chambers, personagem introduzido mais ou menos na metade da trama. Ele é a ligação entre o mundo de Roland e o nosso: o menino teria morrido no nosso mundo, na cidade de Nova York, e simplesmente aparecido no deserto que Roland estava atravessando enquanto perseguia o Homem de Preto. Os dois desenvolvem uma relação pai/filho bastante interessante, o que acaba se provando o teste mais difícil que o pistoleiro precisa passar para provar seu comprometimento para com a busca. Stephen King cria a sua própria versão da ponte de Khazad-dûm, propiciando um clímax angustiante para esta primeira aventura de Roland Deschain.

Roland e Jake Chambers, pelo Ilustrador Michael Whelan
O Pistoleiro não é um dos melhores livros da saga da Torre, justamente por Stephen King não estar em seu auge como escritor, mas ainda assim é um excelente livro, um pouco complexo para se compreender no começo, mas recheado de ação e violência (afinal, estamos falando de um pistoleiro aqui, e do melhor deles), elementos fantásticos e diálogos empolgantes. King não contém seu vocabulário, de modo que palavrões e sexo são coisas tratadas corriqueiramente na trama, por isso - e principalmente pela complexidade da trama - não é adequada para crianças, embora isso dependa de cada um. Como eu já mencionei mai acima, este é apenas o começo das aventuras de Roland, e os próximos livros prometem trazer aventuras muito mais épicas, portanto junte-se a nós nesta jornada em busca da Torre Negra, e boa leitura!

P.S.: Para quem já concluiu a leitura de toda a saga, recomendo fortemente que a releia desde o princípio, com a certeza de que terá outra visão da história quando já se conhece o final. Isto é mais acentuado ainda no primeiro livro, pois ele contém inúmeras pistas do final da saga, que só quem conhece poderia entendê-las. 

sexta-feira, 10 de março de 2017

RESENHA | O Velho Logan



Na esteira do sucesso de Logan, o mais novo filme da franquia X-Men que traz a despedida de Hugh Jackman do papel de Wolverine, trago a resenha da HQ que inspirou este longa que tem sido sucesso de público e crítica desde sua estreia. Escrita por Mark Millar - aclamado roteirista responsável por obras como Guerra Civil, Kick-Ass e Superman: Red Son - e desenhada por Steve McNiven, esta história foi publicada pela Marvel Comics entre as edições 66 e 72 da revista Wolverine, além de uma edição em tamanho gigante contendo sua conclusão, nos anos de 2008 e 2009. Aqui no Brasil ela também foi publicada pela Salvat no volume 58 da coleção de Graphic Novels Marvel.

Assim como o filme estrelado por Jackman, o enredo de O Velho Logan se passa num futuro distópico, no qual o "carcaju" é um dos poucos heróis que restaram após os vilões finalmente dominarem o mundo. Mark Millar nos apresenta um Wolverine abalado não apenas fisicamente - devido à idade e ao fator de cura não funcionar mais tão bem quanto antes - mas também psicologicamente, graças a um evento traumático de seu passado que o fez abandonar a carreira de super-herói. Existe uma antiga lenda Cherokee que diz que há dois lobos - um bom e um mal - em eterno conflito dentro de cada pessoa, e que o mais forte será aquele que mais alimentarmos. Logan então decide parar de alimentar a sua fera interior ao deixar de usar suas mortíferas garras de adamantium; ele abandona a alcunha de Wolverine e resolve viver uma vida pacata como fazendeiro e pai de família no meio oeste americano. Mas, em se tratando do Wolverine, não importa se ele evita encrenca, em algum momento a encrenca acaba procurando por ele, e é isso que acontece quando um velho amigo retorna e lhe faz uma proposta que ele não é capaz de recusar, levando-o por uma road trip pelo território norte-americano, na qual eles irão cruzar o caminho de diversos vilões - velhos e novos -, e passar pelas situações mais inusitadas e absurdas. 

Logan na Estrada

É este clima de viagem que torna a história tão empolgante. Não tem como ver a dupla de heróis cruzando o deserto em um veículo turbinado (alguém aí se lembra do Aranhamóvel?) e não fazer um paralelo com Mad Max, no qual McNiven parece claramente se inspirar. Elementos de filmes western também podem ser identificados na jornada de Logan e sua saída forçada da aposentadoria, além de fazer diversas referências não só ao passado do mutante, mas também do Universo Marvel.

Mark Millar utiliza o ponto de vista do protagonista como a porta de entrada do leitor para este desolado e melancólico mundo, onde as pessoas vivem oprimidas e desesperançadas sob o jugo de um governo despótico de criminosos que fatiaram os EUA em diversos "feudos" em que cada um faz a sua própria lei. É impossível não sentir uma pontada de tristeza quando vemos centenas de pessoas adorando o mjolnir de Thor em uma Las Vegas decadente, aguardando pelo retorno de seus "heróis", ou quando nos deparamos com o gigantesco corpo de Hank Pym tombado sobre uma rodovia.


Wolvernie Liberta a "Fera"

Esta é uma das histórias mais violentas já feitas para o Wolverine, e justamente por isso é uma das melhores. Dois conjuntos de garras afiadíssimas não podem ser utilizados para outra coisa a não ser desmembrar e estripar adversários, e pensar o contrário seria tolice. É para isso que a Arma X foi criada, e é melhor ainda quando testemunhamos toda a resistência e recusa de Logan em liberar suas garras ao longo de quase dois terços da obra. Millar vai "cozinhando" a expectativa do leitor, que aumenta ainda mais quando ele revela o evento que forçou Logan a se aposentar. Quando finalmente vemos Wolverine liberar suas garras (e confesso que achei genial a forma que o autor emprega para ilustrar este grande momento), Millar e McNiven não nos decepcionam. É a primeira vez que vi tanto sangue e tripas em uma HQ da Marvel, e neste ponto a arte de Steve McNiven consegue transmitir com primor toda a violência e fúria animal contidas no Wolverine. E esta história não poderia ter uma conclusão melhor e mais poética, com Logan enfrentando seu primeiro adversário dos quadrinhos: o Hulk!

HQ recomendadíssima para os fãs do Wolverine, por explorar o melhor lado deste icônico personagem dos quadrinhos, e o mais importante: não é necessário ter lido outras HQs do mutante ou possuir grandes conhecimentos além do básico do Universo Marvel para poder entender esta história, que funciona perfeitamente bem sozinha. Para completar, a arte de McNiven está sensacional, cujo enquadramento em close dos personagens em momentos chave e belíssimas imagens panorâmicas traduzem perfeitamente a sensação de estar assistindo a um filme de ação. Só não espere um final feliz, do tipo Bem vence o Mal, ou "e o herói viveu feliz para sempre"! Esta é uma história de dor, de arrependimento e de vingança, principalmente de vingança, que termina com uma longa trilha de corpos e sangue pelo caminho, tanto de vilões como de mocinhos. Boa leitura!

sábado, 4 de março de 2017

RESENHA | A Roda do Tempo, Livro 2: A Grande Caçada

" A Roda do Tempo gira, e Eras vêm e vão, deixando memórias que se transformam em lendas, depois se desvanecem em mitos e já estão esquecidas há muito tempo quando a Era torna a aparecer."



Eis que a Roda do Tempo gira outra vez, trazendo-nos o segundo livro da épica saga de fantasia escrita por Robert Jordan, que, ao lado de George R. R. Martin, figurou como um dos herdeiros de Tolkien. O primeiro livro (confira minha resenha aqui) não teve o mínimo pudor em basear grande parte de sua estrutura narrativa na trilogia d'O Senhor dos Anéis, principal referência do gênero, acrescentando pouca coisa de novo. Na sequência de O Olho do Mundo, porém, Jordan conseguiu se redimir ao afastar-se da sombra de seu mentor para apostar numa trama realmente nova. Não que A Grande Caçada seja uma história original: trata-se da velha busca por um artefato místico capaz de dar àquele que o possuir um grande poder. Tal artefato bem que poderia ser um Anel ou o Cálice Sagrado, mas neste caso é a Trombeta de Valere, a qual, quando tocada, convoca os antigos heróis lendários para lutar em favor do portador da trombeta. Onde o enredo de Jordan acerta, contudo, é em explorar outras possibilidades de seu rico universo fantástico que só haviam sido sugeridas no primeiro livro.

Toda obra de fantasia que se preze tem como uma de suas principais características apresentar uma grande diversidade de povos e raças, cada um com sua cultura e particularidades. Enquanto O Olho do Mundo é um livro mais contido neste sentido, em A Grande Caçada Jordan expande consideravelmente seu universo. Somos apresentados à cidade de Cairhien, onde os nobres vivem um estilo de vida marcado por intrigas e manipulação, o qual eles chamam de O Grande Jogo; descobrimos como os Ogier vivem em suas moradas nas bosques, que eles chama de Pousos; e temos o primeiro contato com o misterioso povo do deserto, os mortíferos Aiel. Nenhum deles tem importância crucial na trama, no entanto servem para enriquecer a leitura, e deixar em aberto possibilidades a serem exploradas e livros futuros.

Mas se há uma facção que recebeu um grande destaque neste livro foi a das Aes Sedai, feiticeiras capazes de canalizar o Poder Único, a magia do universo de Jordan. Ficamos sabendo mais sobre suas subdivisões - as chamadas Ajahs, que variam de acordo com suas personalidades e propensões-, sua hierarquia, seus ritos de passagem, e principalmente, como elas se relacionam entre si. Apesar de fazerem parte de uma mesma Ordem, cada uma das Ajahs tem seus próprios objetivos, e não são raras as vezes em que o objetivo de uma conflita com o de outra. Por exemplo, a Ajah Vermelha tem total aversão a homens, enquanto a Verde busca abertamente a interação com estes. 

Nynaeve, Egwene, Elayne e Min - quarteto de garotas apresentadas no volume anterior, e que possuem alguma relação com Rand - formam o núcleo de Tar Valon, e também são responsáveis pelas cenas mais interessantes do livro. Dentre estas, as que mais evoluem são Nynaeve, que a cada aparição mostra que veio para se tornar a maior Aes Sedai do mundo; e Egwene, a qual, devido às duras experiências por que passa neste volume perde a inocência da jovem camponesa para finalmente descobrir como as coisas realmente funcionam no mundo real. O único ponto que me incomoda é a insistência do autor no romance água com açúcar entre Egwene e Rand, e tudo só piora quando ele resolve inserir não apenas Elayne, mas também Min nesta equação. 

Outra grande novidade que este livro trouxe foi a chegada do povo Seanchan, lá pela segunda metade da história, o que deu um novo fôlego à trama e tornou a leitura muito mais interessante. Os Seanchan supostamente são os herdeiros do lendário imperador Arthur Asa-de-gavião, os quais retornaram do exílio no além-mar para reconquistar o continente principal onde a história se desenrola. Fazendo uma analogia com o nosso mundo, é como se uma das legiões do ditador romano Julio Cesar retornasse de um exílio na América durante a Idade Média, navegando em caravelas portuguesas, e tivesse treinamento militar ao estilo dos samurais japoneses e uma divisão social parecida com as castas hindus. Prece confuso, mas tudo isso se encaixa perfeitamente na trama, e olha que eu não mencionei a principal característica deste povo: a utilização de Aes Sedai escravas como arma de guerra, através de um artefato chamado a'dam, que nada mais é do que uma coleira encantada de prata que obriga a damane (a Aes Sedai escravizada) a cumprir todas as vontades de sua s'uldan (mulher responsável por controlar a Aes Sedai). 

Apesar da clara evolução da obra, Jordan repete alguns erros do primeiro livro, como o ritmo da escrita: enquanto vemos um começo instigante e uma conclusão frenética, o meio é cansativo e até enfadonho às vezes. Curiosamente, as partes mais enfadonhas ficam a cargo do protagonista. Se por um lado Rand al'Thor começa a aprender a utilizar suas recém-descobertas habilidades, por outro ele evolui muito pouco como personagem, permanecendo quase todo o livro estacionado na negação de seu chamado. Ele se recusa o tempo inteiro a aceitar que é o Dragão Renascido - único capaz de derrotar o grande vilão, B'alzamon -, a despeito de todas as profecias que se cumprem ao seu redor, da palavra de Moiraine e até mesmo do testemunho dos antigos heróis ressuscitados pela Trombeta, os quais o reconhecem como a reencarnação de Lews Terin Telamon, o último Dragão. No entanto, tudo leva a crer que ele finalmente irá aceitar seu destino, e esperamos que no próximo livro ele se torne o protagonista que nasceu para ser. 

Outros personagens que também são deixados de lado são a dupla Mat e Perrin: o primeiro, que no volume anterior só servia como alívio cômico e depois se tornou um peso insuportavelmente chato para o protagonista, nesta história continua sendo um peso morto; já Perrin, que em O Olho do Mundo havia recebido bastante atenção do autor e se tornara o personagem mais interessante daquele livro quando descobriu sua habilidade de falar com os lobos, aqui tem muito pouca importância. Por fim, a própria Moiraine, que havia carregado o primeiro livro nas costas e praticamente tirado o protagonismo de Rand, em A Grande Caçada quase não aparece depois dos capítulos iniciais, quando é revelada sua verdadeira missão. 

Colocando todos estes fatos numa balança, é inegável que A Grande Caçada é um livro muito melhor do que o primeiro. É evidente o distanciamento de Robert Jordan do estilo Tolkeniano, sem, contudo, renegar suas origens. A Roda do Tempo é uma saga predominantemente de fantasia, repleta de conceitos originais e muito interessantes, e para quem gosta deste estilo literário, com certeza é um material de primeira qualidade. Sendo uma obra muito extensa (a série foi finalizada com 14 volumes!) é de se esperar que algumas falhas sejam corrigidas e que os personagens, bem como a trama sem si, evoluam junto com os leitores. 

Boa leitura!