terça-feira, 14 de março de 2017

RESENHA | THOR: Ragnarok


Mitologia é um conceito bastante explorado no mundo dos quadrinhos, devido ao seu grande repertório de divindades, heróis e criaturas fantásticas. Há quem considere os heróis atuais versões modernas para os heróis da antiguidade, e se pararmos para pensar um pouco sobre o assunto constatamos que isto faz todo sentido. Na antiguidade o mito de divindades e heróis, os quais, assim como hoje, eram seres humanos com capacidades excepcionais, era disseminado através de histórias, muitas vezes contadas de forma oral, embora diversos registros escritos tenham sobrevivido ao passar dos séculos. A única diferença é que hoje há uma maior facilidade para a propagação dessas histórias, e diversos meios para fazê-lo: os quadrinhos são apenas um deles; outros meios são os livros, filmes, animes, etc. Talvez os exemplos mais icônicos da influência da mitologia nos quadrinhos sejam a Mulher Maravilha, na DC Comics, e o Thor, um dos principais super heróis da Marvel Comics. É sobre este último que eu gostaria de falar na resenha de hoje.

Na mitologia nórdica, Thor é o deus do trovão, filho de Odin, o "Pai de Todos". Ele é conhecido por empunhar o martelo Mjolnir, capaz de destruir montanhas. Sem que muitas pessoas saibam, este deus nórdico é reverenciado até os dias atuais, tendo seu nome associado ao terceiro dia da semana, que em inglês é Thursday (Dia de Thor!).  Em 1962 os roteiristas Stan Lee (aquele mesmo velhinho que costuma aparecer nas cenas pós créditos dos filmes da Marvel) e Larry Lieber, juntamente com o desenhista Jack Kirby (outra lenda das HQs) transportaram Thor do mito para os quadrinhos, transformando-o em um super herói com viés de divindade. Ele estreou nas páginas da 83ª edição da revista Jorney Into Mistery , na qual o deus do trovão trocava de corpo com o médico Donald Blake toda vez que este batia sua bengala de madeira no chão. Ele também seria um dos membros fundadores da superequipe Vingadores, à qual ele é filiado até os dias atuais. Stan Lee e Kirby foram responsáveis por ampliar e consolidar o universo de Thor nos quadrinhos, trazendo para as páginas da revista diversos elementos da mitologia nórdica, como Asgard, Odin, o irmão maléfico de Thor, Loki, Balder, Lady Sif, dentre outros. Muitos roteiristas os sucederiam, construindo sobre os alicerces que eles estabeleceram; alguns com êxito, como Walt Simonson, responsável por uma das fases mais adoradas pelos fãs; já outros não conseguiram lidar com este grande legado e entregaram histórias fracas. Foi justamente após um destes ciclos de histórias ruins, marcado por uma grande baixa das vendas da revista, que a Marvel decidiu cancelar de vez o título do Thor. Em 2004, pegando carona na saga A Queda, que marcou o fim (temporário) dos Vingadores, Michael Avon Oeming e Daniel Berman escreveram Thor: Ragnarok, uma história que tinha como objetivo dar um fim digno a Thor e a todos os habitantes de Asgard.

A Grande Batalha do Ragnarok

Ragnarok significa "O Crepúsculo dos Deuses" e é a versão nórdica para o Apocalipse cristão (inclusive alguns historiadores acreditam que o Ragnarok tenha sido inspirado na escatologia cristã). Ele possui algumas variações, mas basicamente trata-se de como ps inimigos dos deuses se aliam para situar Asgard. Os deuses são convocados para a batalha pela trombeta de Heimdall, e neste confronto quase todos perdem a vida: Odin tomba diante de Fenrir - um monstruoso lobo filho de Loki -, mas é vingado por seu filho Vidal; Thor cai após matar Jormungand, a grande serpente, também filha do deus da trapaça; e Heimdall e Loki matam um ao outro em batalha. No fim Surtur, rei dos gigantes de fogo, queima o mundo inteiro, mas a Terra ressurge após um tempo, e é repovoada pelos humanos e deuses sobreviventes. Este é o Ragnarok conforme a mitologia, porém Oeming e Berman aproveitaram poucos elementos dessas histórias.

A HQ começa mostrando o plano de Loki para finalmente destruir os deuses e governar Asrgard: ele se alia ao gigante de fogo Surtur e consegue replicar o Mjolnir. O deus da trapaça distribui essas novas armas para seus asseclas e faz um ataque avassalador a Thor e seus amigos. Com esta vantagem ele rapidamente espalha a destruição ao longo dos nove reinos, e finalmente consegue realizar seu maior intento. Apesar de ser uma das partes favoritas dos fãs, principalmente daqueles aficionados pela mitologia nórdica e pela cultura medieval, enfim, fãs de O Senhor dos Anéis, para mim esta primeira parte é uma das piores fases do arco. Tudo acontece muito rápido e sem muitas explicações. A conquista de Asgard não é nem sequer mostrada, nem a morte de Balder - estes acontecimentos, que renderiam ótimas imagens pelo lápis da desenhista Andrea Divito, são apenas mencionados em diálogos. Ao invés disso, os autores resolvem trazer os Vingadores para a história, de maneira gratuita e desnecessária, apenas para depois dispensá-los sem qualquer motivo concreto. A impressão que se tem é que eles somente apareceram para ajudar a dar uma turbinada nas vendas da HQ, através da associação do arco com a famosa equipe da Marvel. Outro ponto negativo é a grande quantidade de personagens: os autores resolveram homenagear cada personagem que já passou pela revista do deus viking e lhes dar algum tipo de conclusão, a exemplo do que Alan Moore fizera na despedida do Homem de Aço pré-crise. Isto acaba acarretando uma certa dificuldade de entendimento da história para aqueles que não conhecem a fundo a mitologia do Thor dos quadrinhos.

O Ataque de Loki

A trama começa a melhorar lá pelo final da quarta edição de Ragnarok, quando Thor decide trilhar o mesmo caminho que seu pai Odin seguira em busca de sabedoria. Neste ponto a história se aventura pela natureza mitológica do personagem, com sua viagem às raízes da árvore Yggdrasil, onde fica o Poço de Mimir, local em que ele precisa fazer um sacrifício ainda maior do que seu pai para obter o poder de impedir a ruína dos deuses. No entanto, a história sofre uma grande reviravolta, que muda completamente a perspectiva do herói acerca do Ragnarok: a real ameaça aos deuses é revelada, e Thor, que antes queria impedir o evento, agora precisa levá-lo à cabo até sue final.

Thor: Ragnarok é uma história bem mediana, com um roteiro vacilante, feito de bons e péssimos momentos. O que realmente salva nesta história é a arte de Andrea Divito. A artista italiana usa de abusa de splash pages, e seu estilo de desenho se encaixa perfeitamente na pegada fantástica que inspirou o roteiro de Oeming e Bernan. Basta reparar no Thor que ela desenha, mais Parecido com um guerreiro saído direto de um jogo de RPG.

Recomendo esta HQ apenas para título de curiosidade quanto a esta fase do herói, mas se o objetivo é tentar antecipar alguma coisa da trama do próximo filme do deus do trovão nos cinemas, que possui título homônimo a esta trama, já vou logo avisando que ela não foi inspiração para o roteiro do longa, o qual, pelo que tudo indica, bebe da fonte de histórias mais atuais do Thor, como O Indigno Thor, e também da saga Planeta Hulk. Boa leitura!


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