quarta-feira, 22 de março de 2017

RESENHA | A Torre Negra, Livro 2: A Escolha dos Três


Leitura Prévia:
"E a Torre está mais próxima."

Assim termina o segundo livro da saga A Torre Negra, mais famosa antologia do escritor norte-americano Stephen King. Apesar do otimismo do autor, a verdade é que neste segundo passo da busca de Roland, o último pistoleiro do Mundo Médio, pela mística Torre Negra, a verdade é que há pouco avanço neste sentido. Todo o enredo de A Escolha dos Três se resume à missão de Roland em recrutar companheiros para auxiliá-lo nesta busca; os mesmos companheiros que haviam sido profetizados num jogo de tarô pelo Homem de Preto ao final de O Pistoleiro - primeiro livro da saga. São eles: o Prisioneiro, a Dama das Sombras e a Morte. O pistoleiro vai de encontro a eles através de portais que são abertos unicamente para ele ao longo de uma praia no litoral oeste de seu mundo. Estes portais, na forma de portas comuns de madeira, conectam o mundo de Roland com o nosso mundo, mais especificamente com a cidade de Nova York, em diferentes épocas.

Se em O Pistoleiro era notável a diferença da escrita de King em relação às suas demais obras (lembre-se que ele escreveu O Pistoleiro quando ainda tinha 19 anos), em A Escolha dos Três ele está em sua melhor forma. Sua escrita é fluida, dinâmica, envolvente; King parece conversar com o leitor, ao invés de simplesmente contar uma história. Seu maior talento, contudo, reside na criação de personagens: nenhum deles é raso e unidimensional; cada personagem que surge na trama é dotado de um traço de personalidade próprio e uma história de vida única, mesmo aqueles considerados secundários para a trama (é impossível não sentir pena do dono da farmácia ou da dupla de policiais que cruzam o caminho de Roland durante o terceiro ato). Merecem destaque os três (ou quatro) principais da trama: o próprio Roland, o viciado em heroína Eddie Dean, e Odetta Holmes, uma ativista dos direitos dos negros paralítica e que sofre de dupla personalidade. 

Eddie é o Prisioneiro, e num primeiro momento associamos sua "prisão" como sendo a dependência química que ele tem da heroína; no entanto, conforme Stephen King nos revela mais sobre seu passado, percebemos que seu cativeiro é ainda mais complexo, e está ligado à relação com o irmão Henry Dean, o "eminente e sábio viciado". Mas é Odetta Holmes, a Dama das Sombras, quem realmente rouba a cena neste livro, mais especificamente sua contraparte psíquica, a maligna, pervertida Detta Walker. Enquanto toda bondade ficou concentrada na primeira, Detta herdou todos os traços negativos da personalidade de Odetta. O mais incrível sobre esta personagem é que cada uma das metades desconhece a existência da outra, e toda vez que elas trocam de lugar seu subconsciente inventa uma história sobre o que teria acontecido em sua "ausência", de modo que ela não sofre com períodos de amnésia comuns a pessoas que têm este tipo de quadro psicológico. Odetta/Detta ainda sofre com um grave problema físico: quando jovem ela teve metade das duas pernas decepada em um acidente de trem, que na verdade não foi um acidente. Mas não pense que, sendo paraplégica ela é inofensiva: assim como uma serpente, mesmo se arrastando ela consegue ser a criatura mais ardilosa do livro, e dá muito trabalho para os brancos putos Eddie e Roland. King aproveita a história de Odetta/Detta para tocar na questão dos problemas raciais pelos quais os negros norte-americanos passaram durante as décadas de 50 e 60, tema recorrente de outras obras do autor, como o livro It.

Eddie e Odetta/Detta

Além de recrutar novos membros para seu ka-tet (palavra no idioma do Roland para definir um grupo de pessoas unidos por um mesmo destino), Roland precisa lidar com seus próprios, e tão urgentes quanto, problemas. Logo no prefácio deste livro, King toma uma decisão que me deixou completamente estarrecido. Roland - outrora o maior de todos os pistoleiros -, tem os dois primeiros dedos da mão direita decepados pelas lagostrosidades, umas criaturinhas parecidas com lagostas que habitam a praia onde a história se desenrola. Quando isto aconteceu eu pensei: pronto, agora o cara conseguiu ferrar de vez com a melhor característica do seu protagonista, que é justamente de ser um grande atirador! Felizmente, o pistoleiro ainda consegue atirar com a mão esquerda, e mesmo doente (além de tudo o mais suas feridas começam a gangrenar) ele ainda consegue ser um dos mais mortais atiradores que eu já tenha ouvido falar, haja vista a cena insana do tiroteio no restaurante do narcotraficante Enrico Balazar, a qual não tem como deixar de comparar com as cenas dos filmes do Quentin Tarantino.

A Escolha dos Três é quando realmente a história d'A Torre Negra começa, não apenas por ser o livro que ditaria o ritmo e o estilo de escrita de todos os demais da saga, mas porque ele apresenta os personagens centrais desta grande trama que só começará a se desenrolar a partir do próximo volume. A Torre Negra foi publicada aqui no Brasil pelas editora Suma de Letras e Ponto de Leitura, e pode ser encontrada facilmente nas principais livrarias do país.

Boa leitura!

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