
A década de 90 ficará para sempre marcada na memória dos fãs como a Idade das Trevas dos Quadrinhos. Após a explosão criativa dos anos 80, a década seguinte viu uma queda vertiginosa na qualidade dos roteiros, seguida por uma tendência de desenhistas em representar seus personagens em formas anatomicamente impossíveis - homens com músculos extremamente bombados e mulheres com curvas tão loucas e com pouquíssimas vestimentas, que viriam a povoar os sonhos mais secretos dos adolescentes da época. Esta tendência começou logo após a criação da editora Image Comics, fundada por artistas descontentes oriundos majoritariamente da Marvel Comics. As duas editoras dominantes do mercado - Marvel e DC - combateram esta nova concorrência da única forma que sabiam: resolveram copiar o estilo da rival! E assim as publicações dos principais heróis dos quadrinhos foram infectadas por esse movimento iniciado pela Image.
A DC, particulamente, destacou-se pela decisão de desconstruir o conceito da invencibilidade de seus maiores heróis. Foi então que veio a polêmica A Morte do Superman, que causou um rebuliço danado no mundo inteiro. Fãs chocados viram pela primeira vez a morte do primeiro e maior super herói de todos, e o surgimento de não apenas um, mas quatro Supermans substitutos! Contudo, assassinar um medalhão da editora não foi suficiente: era preciso tirar de cena outro grande super herói. Foi aí que o então editor Dennis O'Neil e os roteiristas Chuck Dixon (Detective Comics), Doug Moench (Batman) e Alan Grant (Shadow of the Bat) conceberam a maxissérie A Queda do Morcego, na qual o Cavaleiro das Trevas teve sua coluna quebrada pelo brutamontes movido a anabolizante Bane, vindo a ficar temporariamente paraplégico.
Por incrível que pareça, a ideia original não era tão ruim. O primeiro arco, intitulado Knightfall (traduzido aqui no Brasil como A Queda do Morcego), no qual Bane libertou do Asilo Arkham todos os vilões que o Batman havia capturado, rendeu algumas boas histórias. O plano do vilão latino era simples e dotado de uma certa genialidade: deixar que o Batman se esgotasse física e mentalmente enquanto tentava recapturar os vilões fugitivos, para então, quando ele estivesse completamente exaurido, desferir o último golpe que quebraria para sempre o Morcego. Até aí tudo bem, o problema foi o que aconteceu depois...
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Vilões Escapam do Arkham |
Era de se esperar que, após recrutar um jovem órfão, ensiná-lo todas as suas técnicas de luta e investigação, e levá-lo em patrulhas noturnas pela cidade mais violenta do mundo, Batman estivesse preparando um substituto para quando morresse ou decidisse se aposentar. Infelizmente, os roteiristas desta saga resolveram ignorar completamente Dick Grayson - atuando agora como o Asa Noturna - e passar o Manto do Morcego para a pessoa mais improvável de todas: um jovem violento, impulsivo e mentalmente desequilibrado que havia sofrido lavagem cerebral por uma ordem religiosa de fanáticos que queriam que ele fosse o seu anjo da morte: Jean-Paul Valley, o Azrael. Este novo Batman atenderia às novas demandas dos jovens da década de 90: o antiquado uniforme clássico foi substituído por uma armadura à prova de balas que guardava uma semelhança com o uniforme de um certo herói da Image - Spawn -, e era dotada de garras afiadas, lança-chamas e disparadores automáticos de batarangs. O ultrapassado código de ética de Bruce Wayne também foi deixado de lado em favor de uma atitude mais rígida em relação aos bandidos, no melhor estilo "bandido bom é bandido morto".
O arco de histórias que engloba o período em que Jean-Paul Valley atuou como o novo Batman foi intitulado Knightquest: The Cruzade (A Cruzada), e até hoje é considerado um período a ser esquecido pelos fãs no Morcego. O Batman já foi substituído outras vezes nos quadrinhos, mas nenhum substituto foi tão ruim quanto Jean-Paul, nenhum deles maculou tanto o legado do Morcego como o antigo Azrael.
A segunda parte de Knihtquest, denominada The Seacrh, acompanha os passos de Bruce e Alfred. Mesmo preso a uma cadeira de rodas, Bruce parte em uma missão para resgatar sua médica, a Drª. Shondra Kinsolving, e o pai do Robin, que haviam sido sequestrados por um misterioso grupo, deixando Gotham City completamente a mercê de um Batman lunático. Esta busca acabou por levar Bruce a uma cura para sua condição física, que vem por meio de um descarado Deus Ex Machina.
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Jean-Paul Valley |
O terceiro e último arco desta saga - KnigtsEnd - marcou o retorno de Bruce Wayne à identidade de Batman, que precisou ser reconquistada das garras de Jean-Paul. Esta fase teve uma pequena melhora no roteiro: achei interessante o confronto das duas versões do Cavaleiro das Trevas, com o desafio de Bruce Wayne provar que seu intelecto é superior à toda tecnologia da qual o Jean-Paul Valley ficou dependente. Outro ponto positivo foi o treinamento pelo qual Bruce se submeteu com a assassina Lady Shiva. Após meses fora de forma, seria muito forçado colocá-lo num confronto direto com Jean-Paul, que já havia derrotado Bane com facilidade. Achei uma boa sacada do roteirista a meta que Batman colocou para si próprio de estar pronto para o embate apenas quando fosse capaz de realizar o "salto de fé" do alto de um edifício.
A Queda do Morcego foi a primeira das megassagas que passaram a tomar conta das revistas do Batman e seus associados durante mais de um ano inteiro. A ela sucederam-se outras sagas que seguiam o mesmo modelo, como Contágio, Legado, Terra de Ninguém e Jogos de Guerra. Este tipo de estratégia de vendas era comum no mercado de HQs da época, já que, para ficar por dentro da história que estava rolando no universo do Morcego era preciso adquirir vários títulos todo mês, o que tornou um suplício a vida do colecionador de quadrinhos. Até hoje é difícil encontrar ecadernados que reunam toda esta fase; aqui no Brasil só saiu uma versão reduzida de Knighfall, que foi apenas até o ponto em que Bane quebra a coluna do Batman. De qualquer forma, como eu já havia dito antes, esta é a melhor fase desta saga na minha opinião, sendo o restante esquecível. Basta saber que existiu um segundo Batman e que ele só fez m&rd@!
Se é possível extrair um legado positivo de A Queda do Morcego, eu citaria a criação de Bane, que veio a ser uma importante aquisição para a galeria de vilões do Batman. Ao contrário do que muita gente pensa, Bane não é apenas um brutamontes descerebrado, mas um estrategista nato, com um gênio que poderia se equiparar ao do próprio Bruce Wayne se não fosse por seu vício no esteróide Veneno. Afinal, ele foi o único vilão capaz de derrotar o Batman, e de maneira tão humilhante: quando ele quebrou a coluna do herói, o Batman já estava quebrado há muito tempo, pois a verdadeira derrota que ele sofreu foi psicológica, e demoraria muito tempo até ele se reerguer desta "queda".
Então é isso p-pessoal! Espero que tenham gostado desta resenha. Boa leitura!
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Capa de Knightfall Vol.1 (Versão Americana) |
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