quinta-feira, 20 de abril de 2017

RESENHA | Batman: Ano Um


Ao lado de Superman e Mulher Maravilha, o Batman constitui um dos principais pilares da DC Comics e um dos maiores expoentes, não apenas dos quadrinhos, mas de toda a cultura pop. Criado em 1939 por Bob Kane e Bill Finger, ele fez sua estreia nas páginas da revista Detective Comics #27, aproveitando o sucesso de outro super herói da editora, o Super Homem. O notório detetive fantasiado de morcego - inspirado nos heróis dos pulps Zorro e Sombra, em um filme mudo de 1926 chamado The Bat, e em um esboço de asas quirópteras de Leonardo DaVinci -, fez um sucesso inesperado, e acabou ganhando um título próprio em 1940. A primeira edição desta revista trazia logo em suas primeiras páginas a gênese do personagem: o fatídico assassinato do casal Thomas e Martha Wayne, o árduo treinamento físico e mental pelo qual o jovem Bruce Wayne passou, e sua decisão de tornar-se um vigilante mascarado.

Após 4 décadas de publicação ininterrupta - um caso raro dentro do mundo dos quadrinhos -, esta ainda parecia a origem perfeita para o Batman. O reboot implementado pela editora em 1986, no entanto, ofereceu a oportunidade perfeita de inserir esta origem num contexto mais atual e realista, que agradasse tanto aos leitores de quadrinhos mais maduros e exigentes do final do século XX, como os antigos fãs do personagem. Para esta tarefa foi escolhido um jovem roteirista que já havia provado seu talento ao escrever e desenhar uma das Graphic Novels mais consagradas de toda a nona arte: O Cavaleiro das Trevas. Ao lado do artista David MazzuchelliFrank Miller concebeu uma minissérie em 4 partes que revisitava o primeiro ano da carreira do Cruzado Encapuzado como combatente do crime em uma Gotham City inspirada na Nova York dos anos 80, infestada de gangues, traficantes de drogas, prostitutas e policiais corruptos.

A Origem do Morcego, em Batman #1

O roteiro de Batman: Ano Um segue os passos de dois personagens distintos: Bruce Wayne, jovem e órfão milionário que retorna a Gotham City após 12 anos viajando pelo mundo, e o policial James Gordon, que chega à cidade vindo de Chicago para integrar as fileiras do DPGC (Departamento de Polícia de Gotham City). Apesar de suas diferenças, ambos possuem um objetivo comum: livrar a cidade da escória criminosa que assola seus habitantes. Enquanto Gordon está decidido a cumprir esta difícil tarefa do lado da lei, Bruce treinou por mais de uma década para se tornar um vigilante, impelido pelo juramento feito após a morte dos pais.

O início da carreira do Bruce Wayne como combatente do crime não é nada fácil. Com 25 anos, ele está longe de se tornar o herói invencível que todos conhecemos. Impetuoso e inexperiente, ele é capaz de cometer os erros mais bobos, e isso torna a história muito mais crível, já que Miller não nos apresenta um herói nascido pronto, para quem tudo dá certo logo no começo. A primeira incursão de Bruce ao submundo de Gotham é quase fatal para ele, e lhe proporciona um amargo choque de realidade. Esta derrota, entretanto, é usada pelo roteirista como o catalisador para a criação do Batman, aliada a uma certa dose de misticismo simbólico. A icônica cena em que Bruce recebe a visita do Morcego é resgatada da gênese original do personagem e também utilizada por Miller em O Cavaleiro das Trevas para este mesmo propósito.

Bruce Wayne decide se tornar o Batman

O futuro Comissário Gordon é mostrado sob uma perspectiva mais humana. Apesar de tentar conciliar sua vida pessoal com o trabalho o melhor que pode, ele ainda é capaz de cometer erros, como trair a esposa com uma parceira de trabalho. Isso acaba deixando-o mais vulnerável aos ataques de seus inimigos, que decidem explorar este ponto fraco. 

Além de Gordon, outros personagens clássicos do cânone fazem sua estreia nas páginas dessa minissérie. A Mulher Gato tem sua origem completamente remodelada e cercada de polêmicas: Selina Kyle aparece como uma prostituta que, inspirada pelo Batman, veste uma fantasia sensual de gata para efetuar roubos arriscados. Além disso, em alguns momentos fica subentendido que ela seria lésbica, o que hoje causaria bem menos impacto do que na década de 80. Esta visão radical e pouco glamourosa da origem da personagem deixou alguns fãs incomodados, de modo que, assim que teve a oportunidade, a DC Comics aproveitou reescrever a história de origem da ladra mais famosa dos quadrinhos. 

O assistente de promotoria Harvey Dent - que mais tarde viria a se tornar o vilão Duas Caras -, também dá as caras (perdão pelo trocadilho) nesta história, atuando como um improvável aliado do Morcego, a despeito da perseguição pública ao vigilante empreendida pela polícia. Ele trabalha ao lado do Batman para desmontar o império criminoso de Carmine "Romano" Falcone, cuja organização possui braços infiltrados em todas as esferas de poder do governo de Gotham City, incluindo o DPGC. Falcone foi criado por Frank Miller para ser o principal antagonista de Ano Um, e foi baseado no famoso mafioso Don Vito Corleone, dos livros de Mario Puzo, e é uma espécie de Rei do Crime da DC. 

Batman Desafia os Criinosos

Apesar dos frequentes saltos temporais (lembre-se que esta história se passa ao longo de um ano inteiro), a fluidez do roteiro não é prejudicada. Cenas de ação são frequentes e muito bem elaboradas, intercaladas entre diálogos bem construídos ou breves relatos feitos por apresentadores de televisão - novamente Miller usa deste recurso visual, embora em menor escala do que em O Cavaleiro das Trevas. A arte de David Mazzucheli, que já havia colaborado com Miller em Demolidor: A Queda de Murdock, está sensacional, e casa perfeitamente com o realismo proposto por Frank Miller. O obra prima se completa com as belas cores de Richmond Lewis, que coloriu à tinta os desenhos de Mazzuchelli. 

Batman: Ano Um foi publicada em Batman #404-407 e já foi reimpressa diversas vezes, inclusive em formato de luxo (aqui no Brasil ela foi publicada pela Panini Comics). Considerada pelos fãs a origem definitiva do Homem Morcego, esta HQ já foi adaptada para uma animação da Warner Animation e serviu de inspiração para o roteiro de Batman Begins, de Cristopher Nolan. Ela foi eleita pelo site IGN a segunda melhor história do Batman, atrás apenas de O Cavaleiro das Trevas, e eu concordo com esta avaliação. Para mim, a visão crua e realista tão comum aos roteiros de Miller são um diferencial que a colocam acima de outras obras de quadrinhos e faz com que quase possamos conceber o Batman como um herói real. Item mais do que recomendado para os fãs do Batman e dos quadrinhos em geral.

Boa leitura!

Batman: Ano Um - Capa

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