domingo, 21 de maio de 2017

ENTENDA MELHOR | Cronologia DC Comics

Da Era de Ouro ao Rebirth, ajudamos você a entender os principais eventos que afetaram as publicações da DC Comics ao longo dos anos.


Action Comics #1 e Detective Comics #27 

A origem da DC Comics remonta aos anos 30, quando ela ainda se chamava National Allied Publications, empresa que mais tarde viria a se fundir com a Detective Comics Inc. para formar a National Comics. Em 1938, na revista Action Comics #1, surgia o primeiro grande ícone desta editora, inaugurando o período que viria a ser conhecido mais tarde como a Era de Ouro dos Quadrinhos: o Superman. No ano seguinte foi a vez do Batman fazer a sua estreia nas páginas de Detective Comics #27, aproveitando o sucesso do Homem de Aço. A década seguinte viu uma explosão de super heróis nas páginas dos quadrinhos americanos: em 1940 surgiram Lanterna Verde e o Flash -, ambos em suas versões clássicas, como Alan Scott e Jay Garrick (aquele mesmo com um capacete de alumínio com asas nas laterais) -, e no próximo a Mulher Maravilha, primeira heroína dos quadrinhos, e o Aquaman. Juntamente com outros heróis que faziam sucesso na época, eles formaram o primeiro supergrupo da história: a Sociedade da Justiça da América, inspiração para diversas outras equipes de heróis que surgiriam no futuro, como a Liga da Justiça e os Vingadores.

O momento histórico pelo qual passavam os EUA, principalmente a 2ª Guerra Mundial, tiveram grande influência nas histórias dessa época. Verdadeiros símbolos do "american way of life", era comum ver super heróis no fronte enfrentando soldados nazistas ou japoneses. Com o fim da guerra, contudo, sua popularidade caiu vertiginosamente, e eles perderam espaço nos quadrinhos para romances e westerns. Felizmente, na década de 60 os super heróis voltaram a fazer sucesso, embora sob o jugo do infame Comics Code Autorithy, uma regulamentação imposta pelo governo americano que impunha censura no conteúdo dos quadrinhos. Nesta época, a DC aproveitou para reformular totalmente alguns de seus personagens: o Flash agora era Barry Allen, um policial forense que ganhou supervelocidade após ser atingido por um raio em seu laboratório; o Lanterna Verde deixou de ter poderes místicos para se tornar membro de uma força policial interplanetária; e no lugar da JSA surgiu a Liga da Justiça, que nada mais era do que uma versão atualizada da antiga Sociedade. Apesar de outros heróis terem se juntado à Liga mais tarde, esta primeira formação é considerada a formação definitiva da equipe, constituída pelos sete pilares fundamentais da editora: Superman, Batman, Mulher Maravilha, Flash, Lanterna Verde, Aquaman e Caçador de Marte. Esta fase ficou conhecida como a Era de Prata dos Quadrinhos.

Embora essas mudanças tenham agradado os leitores, muitos fãs ainda sentiam saudades dos antigos heróis da Era de Ouro, e se perguntavam o que teria acontecido com eles. A explicação proposta pelos editores resultou em um dos conceitos que se tornariam uma das pedras fundamentais das grandes sagas da DC Comics: a questão dos múltiplos universos. Nesta nova concepção, os heróis da Era de Ouro na verdade viviam em um universo alternativo, em uma Terra paralela apelidada de Terra-2. Foi na clássica Flash #123, de 1961, intitulada "Flash de Dois Mundos", que o segundo Flash, Barry Allen, encontrou Jay Garrick, marcando o primeiro de muitos encontros entre indivíduos dos dois universos. Além disso, foi no inédito encontro entre a Liga da Justiça e a JSA que a palavra "Crise" foi utilizada pela primeira vez para nomear um grande evento da editora. Mas as coisas não pararam por aí. Outros universos foram sendo adicionados ao recém formado "Multiverso DC", e diversas versões do mesmo herói começaram a surgir e a interagir umas com as outras, criando um verdadeiro desafio para os novos leitores que tentavam entender a confusa cronologia da editora.

The Brave and the Bold #28 e Flash #123

Conforme as décadas de 70 e 80 se passaram, os leitores de quadrinhos americanos cresceram, porém não abandonaram o hábito da juventude; pelo contrário, passaram a demandar histórias com enredos mais maduros e realistas, que retratassem as condições sociais do país naquela época, ignoradas até então em virtude do Comics Code Authority. No início da década de 70 a dupla Dennis O'Neil e Neal Adams abalaram as estruturas da indústria dos quadrinhos com a aclamada série Lanterna Verde/Arqueiro Verde, que mostrava os dois heróis esmeralda em uma viagem pelo território americano enfrentando os vilões da vida real, como os preconceitos racial e social, o crime organizado e as drogas. Embora não tenha feito tanto sucesso na época, esta história foi a semente para a grande revolução que ocorreria na próxima década.

Duas obras foram fundamentais para estabelecer a mudança de paradigma dentro do universo dos quadrinhos na década de 80: O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller, e Watchmen, de Alan Moore. A primeira mostrava um Batman velho e amargurado sendo obrigado a deixar a aposentadoria para enfrentar a constante escalada do crime em Gotham City; já Watchmen trata-se de uma paródia do conceito que se tinha dos heróis uniformizados, expondo todas as suas fraquezas e defeitos quando inseridos na dura realidade da Guerra Fria. Estas duas Graphic Novels marcaram o fim da inocência dos quadrinhos, ao revelar um lado mais sombrio dos super heróis, e inauguraram a chamada Era Moderna dos Quadrinhos, também conhecida como a Era Sombria dos Quadrinhos.

Na tentativa de se adequar a este novo contexto, e desejando realizar uma faxina editorial que tornasse mais simples o entendimento de suas histórias, a DC Comics encomendou a histórica Crise nas Infinitas Terras, uma maxissérie em 12 edições nos mesmos moldes das Guerras Secretas da Marvel. Nesta saga os diferentes heróis das diferentes Terras precisaram se unir para enfrentar a ameaça do Antimonitor, que pretendia destruir todo o Multiverso até que só sobrasse o universo de antimatéria. O vilão foi derrotado no final, embora ao custo das vidas do Flash e da Supergirl, e todos os universos paralelos foram apagados e incorporados ao universo principal. Com o advento deste recém criado universo, todas as revistas da editora sofreram um reboot, e as origens de seus principais heróis foram completamente reformuladas e atualizadas. A nova origem do Superman foi mostrada na minissérie O Homem de Aço, de John Byrne; já Frank Miller reescreveu a origem do Cavaleiro das Trevas em Ano Um; e George Pérez ficou com a revista da Mulher Maravilha. O ajudante do Flash, Wally West, antigo Kid Flash, herdou o manto de seu professor, e se tornou o novo velocista a proteger as cidades gêmeas de Keystone e Central City.

A fase que sucedeu a Crise nas Infinitas Terras é a que a maioria de nós, nascidos nas décadas de 80 e 90, acompanhamos durante nossa juventude. Todas as referências que temos, tudo que sabemos sobre os heróis da DC, as grandes sagas que marcaram época, pertencem a esta fase.


Crise nas Infinitas Terras

A década de 90 foi uma espécie de Idade Média dos quadrinhos. Após a enxurrada criativa dos anos 80, veio a ressaca: os roteiros sofreram uma queda considerável de qualidade, e a arte passou por um dos piores momentos da história, em grande parte influenciada pelo surgimento da Image Comics, editora formada por artistas descontentes com a política protecionista das grandes editoras em relação aos direitos dos personagens criados por eles. Os títulos da Image não tinham como prioridade o roteiro, e apelavam para um estilo de arte controverso, com super heróis exageradamente musculosos e armados até os dentes e heroínas voluptuosas de curvas extravagantes. Infelizmente este estilo se alastrou para as editoras principais, já que, de certa maneira, ele agradava aos jovens leitores da época, sem contar que era um reflexo do que se via também no cinema, com filmes de ação estrelados por brucutus como Arnold Schwarzenegger, Sylvester Stallone e Jean-Claude Van Damme.

Outro fator que caracterizou esta época foi a decisão da DC de quebrar a invencibilidade de seus principais heróis, permitindo algumas decisões criativas bastante polêmicas, tais como: matar o Superman; tornar o Batman paraplégico e substituí-lo por um vigilante psicótico; fazer Hal Jordan se transformar no supervilão Parallax. Também era comum que várias dessas histórias se passassem em imensos arcos, as chamadas megassagas, que duravam meses ou até mesmo anos, e se passavam em diversos títulos, de modo que para acompanhar tudo o que estava se passando era preciso ser rico ou viver apenas de quadrinhos. Um claro exemplo disso foi a saga Terra de Ninguém, que afetou as revistas do Batman e de seus associados.

Para variar, a DC não poderia deixar de realizar um grande crossover entre seus principais títulos. Desta vez a "crise" não teve a ver com dimensões paralelas, mas com o tempo. Em Zero Hora, Hal Jordan, agora um dos vilões mais poderosos do universo, tentou reiniciar a linha do tempo para apagar a destruição de Coast City. A conclusão desta saga causou mudanças para alguns personagens da DC, em uma escala bem menor do que as que aconteceram na Crise nas Infinitas Terras. Por exemplo, a carreira de prostituta de Selina Kyle antes dela se tornar a Mulher Gato, como visto em Ano Um, foi eliminada da continuidade, todas as versões do Gavião Negro foram unidas em uma só, e o filho do Arqueiro Verde foi introduzida na cronologia.

Apesar de todas as dificuldades, a década de 90 também teve seus pontos altos. Um deles foi a criação do selo adulto da DC, a Vertigo. A criação deste selo remonta ao final da década anterior, quando da "invasão britânica" aos quadrinhos estadunidenses. Após o sucesso do roteirista Alan Moore na revista do Monstro do Pântano, a editora chefe Karen Berger entregou diversos personagens menores da DC para roteiristas vindos do Velho Continente, concedendo-lhes total liberdade criativa. Neil Gaiman pegou Sandman, um herói obscuro da Era de Ouro, e o transformou numa das maiores obras primas da nona arte; Jamie Delano recebeu a oportunidade de trabalhar as origens do anti herói místico John Constantine, nascido nas páginas do Monstro do Pântano; enquanto Grant Morrison pôde aplicar na revista do Homem Animal várias de suas ideias mirabolantes. A Vertigo foi criada em 1993 e reuniu todas as revistas que recebiam a indicação "Sugerido para Leitores Maduros", como forma de escapar da censura do Comics Code Authority, e foi responsável pelas melhores histórias lançadas na época.

A Morte do Superman e A Saga do Monstro do Pântano

A virada do milênio inaugurou uma fase de excelentes histórias, capitaneadas por um time de roteiristas de peso, como Geoff Johns, Greg Rucka, Grant Morrison e Mark Waid. Dentre eles com certeza o principal foi Johns, responsável por reintegrar Hal Jordan ao panteão dos principais heróis da DC em Lanterna Verde: Renascimento, e por fazer novamente o Superman ter boas histórias, como Superman: O Último Filho, Brainiac e Nova Krypton. Geoff Johs esteve à frente também das grandes sagas que sacudiram as estruturas do Universo DC, como Crise Infinita e A Noite Mais Densa. A primeira foi concebida como uma continuação para a Crise nas Infinitas Terras, promovendo algumas mudanças no status quo da editora, como o ressurgimento de um Multiverso composto por 52 realidades alternativas.

Grant Morrison, por sua vez, levou os enredos das revistas do Morcego para direções totalmente inesperadas. Para começar, ele deu um filho para o Batman. O garoto, Damian Wayne, é filho de Bruce Wayne com Tália al Ghul, e teria sido fruto de uma relação que os dois tiveram no passado. Após descobrir a existência da criança, o passo mais óbvio, pelo menos para  Batman, foi treiná-lo para ser o próximo Robin. Todas as histórias que vieram a seguir conduziram o Morcego à sua derradeira batalha contra o deus Darkseid em Crise Final, na qual o Batman aparentemente morreu. Apesar do título ter prometido uma grande mudança editorial na DC (afinal, a palavra "Crise" estava no título), levando ao provável reboot que todos já esperavam, o resultado desta saga foi "apenas" a morte do Batman - e sua consequente substituição por Dick Grayson -, e o retorno do Flash Barry Allen, após ter ficado anos preso dentro da Força da Aceleração.

O tão esperado (e temido) reboot aconteceu após a minissérie Flashpoint, iniciado em 2011. Barry Allen mal voltou e já faz m3r#@ quando decide voltar no tempo para impedir o Flash Reverso de assassinar sua mãe, porém isso acaba afetando a linha do tempo e modificando eventos primordiais da vida de praticamente todos os personagens da DC. O Batman agora era Thomas Wayne, que decidiu se tornar um vigilante após a morte do filho Bruce, assassinado por um criminoso; o Superman nunca foi encontrado por seus pais terrestres, e desde criança permaneceu sob a custódia do governo americano; e a Mulher Maravilha e Aquaman lideram uma batalha entre Themyscira e Atlântida, que mergulha o mundo inteiro no caos. O Flash consegue reverter este cenário, mas não ao status de antigamente; toda a cronologia DC é zerada e reiniciada em uma nova linha do tempo conhecida como Os Novos 52.

Crise Infinita

O medo dos fãs de que um reboot muito radical acabasse por mudar demais a cara do Universo DC acabou se provando justificado. Apesar de alguns acertos, Os Novos 52 foi um período desastroso para a DC Comics. Alguns personagens ficaram muito descaracterizados, e essas mudanças não agradaram nem um pouco os leitores mais antigos. Enquanto Batman e Lanterna Verde tiveram poucas mudanças, Superman e Mulher Maravilha foram completamente reformulados. A origem clássica da princesa amazona, na qual ela era nascida do barro, foi trocada para uma na qual ela era filha de Zeus, e, consequentemente, uma semideusa; já o Superman deixou de ser aquele herói experiente e "certinho" que estávamos acostumados para se tornar um herói mais jovem e agressivo. As relações de ambos com seus pares românticos de longa data, Steve Trevor e Lois Lane, respectivamente, foram deixadas de lado, e os dois heróis formaram um par romântico que dividiu opiniões.

Em relação aos acertos desta fase, não poderia deixar de citar o Batman, que se tornou o principal carro-chefe da DC, e seu principal impulsionador de vendas. Sob a tutela de Scott Snyder e Greg Capullo, tivemos excelentes histórias como A Corte das Corujas, que introduziu um novo e interessante vilão, e os arcos A Morte da Família e Fim de Jogo, ambos focados na relação entre Batman e o Coringa. Outro ponto alto dos Novos 52 foi a reformulação do Aquaman tocada por Geoff Johns, com o objetivo de limpar a ficha do herói marítimo, livrando-o do carma de super herói mais inútil da editora.

Ainda assim, os erros foram maiores que os acertos, e não demorou para os editores perceberem que seria necessária uma mudança que trouxesse de volta elementos clássicos dos velhos tempos da DC, sem, contudo, abrir mão das atualizações realizadas até então. Foi então que surgiu a ideia do Rebirth, fase mais atual da DC, que veio para consertar as falhas dos Novos 52, explicadas como uma manipulação espaço-temporal realizada por uma misteriosa entidade, possivelmente o Dr. Manhattan, do universo de Watchmen. Esta entidade teria interferido nos eventos de Flashpoint e "roubado" uma década inteira da vida de todos os heróis, afetando negativamente suas vidas ao impedir que certos laços fossem consolidados.

O Rebirth (ou Renascimento, como está sendo promovida aqui no Brasil pela Panini) ainda está envolta em muitos mistérios, e está longe de acabar; porém o seu objetivo é claro: além de restaurar a DC ao seu status quo original de antes do Flashpoint, é também o de integrar o universo de Watchmen ao universo regular da editora. Uma decisão corajosa, no mínimo, já que Watchmen possui fãs muito fervorosos, que com certeza não ficarão nem um pouco animados com sua adição ao universo mainstream. O sucesso das vendas, que colocaram as revistas da DC novamente no topo nos EUA, mostram que a editora está no caminho certo, e até agora vem agradando à maioria dos fãs. Resta-nos torcer para que os roteiristas sejam capazes de entregar uma história digna dos quase 80 anos desse incrível Universo.

Rebirth

domingo, 14 de maio de 2017

RESENHA | Planeta Hulk


Criado em 1962 por duas lendas dos quadrinhos, Stan Lee e Jack Kirby, como uma versão moderna do Dr. Jakyll e sua contraparte monstruosa, o Dr. Hyde, o Incrível Hulk é o alter ego do cientista nuclear Bruce Banner, o qual, devido à exposição à radiação gama, se transforma nessa criatura esverdeada e superpoderosa quando submetido a um estresse psicológico, principalmente a raiva. Inicialmente cinza, ele já foi verde e até vermelho; já teve não apenas duas, mas quadro personalidades diferentes habitando seu corpo; já foi retratado como um brutamontes irracional que destrói tudo em seu caminho, e também como um ser de intelecto elevado e imbuído de heroísmo; já caiu de pau com o Coisa, o Demolidor, o Wolverine, o Thor, os Vingadores, enfim... já enfrentou quase todo o Universo Marvel, mas também já salvou o mundo inúmeras vezes. Ainda assim, seus feitos ruins acabaram pesando mais que suas boas ações na balança moral dos Iluminati, um grupo secreto formado pelos maiores heróis da Terra - Homem Elástico, Doutor Estranho, Homem de Ferro, Raio Negro e Namor -, que decidiram exila-lo para um planeta desprovido de vida inteligente onde ele não poderia ferir mais ninguém. Entretanto, a nave em que eles o colocaram foi interceptada por um buraco negro e acabou caindo no planeta Saakar, onde um imperador cruel promovia combates entre gladiadores para entreter a população oprimida. Hulk é então capturado e obrigado a participar desses jogos, lutando ao lado de outros monstros em batalhas sangrentas até a morte.

Pela primeira vez em sua vida, o Hulk está em casa!

Huk é Exilado da Terra

A ideia por trás do arco Planeta Hulk é simples. O roteiro de Greg Pak é baseado na história dos gladiadores da época do Império Romano, em especial Spartacus, um gladiador que se rebelou contra o Império e conseguiu reunir um grande exército de escravos que quase tomou Roma. Os artistas Carlo Pagulayan e Aaron Lopresti pegam emprestados diversos elementos visuais da Roma antiga, como os trajes de legionário dos soldados do imperador e a armadura de gladiador usada por Hulk, com seus capacetes de penas e protetores para os braços.

Outra clara inspiração é a famosa "Jornada do Herói", conceito desenvolvido pelo antropólogo Joseph Campbell que estabelece os estágios percorridos pelo herói na maioria das histórias, desde os mitos da antiguidade aos filmes e quadrinhos modernos. Em Planeta Hulk acompanhamos ao longo de suas 15 edições o Hulk evoluir do gladiador Cicatriz Verde, como ficou conhecido após sua primeira batalha, para o "Filho de Sakaar", uma espécie de Messias profetizado que libertaria todas as raças daquele planeta de seus opressores, passando por vários estágios do monomito de Campbell.

A questão da dualidade de Hulk é muito bem trabalhada por Greg Pak. Estando em meio a todo tipo de alienígena, das mais variadas espécies, Hulk se torna apenas mais um entre tantos monstros. Hulk não é mais desprezado ou temido por seus companheiros devido à sua natureza violenta; pelo contrário, seu poder é necessário e útil para os gladiadores rebeldes, que o reconhecem como o herói que ele realmente é. Ao contrário do que acontecia na Terra, é quando retorna à forma humana que ele se torna um ser "diferente", e justamente por isso ele procura esconder essa sua natureza.

Hulk, Korg, Miek, Hiroim, Elloe e a Criatura da Ninhada

De início, ainda furioso por ter sido exilado por seus antigos amigos humanos e por ter sido escravizado, se recusa a enxergar seus companheiros de luta como amigos. Porém, o tempo e as experiências, geralmente de perda, pelas quais eles passam fazem com que se tornem mais que amigos: verdadeiros irmãos. Os companheiros de guerra de Hulk são: Miek, um ser pertencente a uma raça de criaturas insetoides de Saakar; Korg, uma das criaturas de pedra que foram os primeiros adversários do Thor; outro inseto, uma fêmea sobrevivente do povo da Ninhada; Elloe, filha de um senador do império acusado de subversão; e Hiroim, um renegado do povo das Sombras, de onde o imperador recruta seus principais guardas.

Embora exista uma grande gama de personagens, apenas alguns deles são desenvolvidos pelo roteirista, enquanto outros servem apenas como coadjuvantes com funções específicas no roteiro. É o caso de Korg, que na maior parte das vezes atua como guarda costas ou companheiro de luta de Hulk, e a criatura da ninhada, que após uma introdução sangrenta funciona apenas como parceira de Miek. É o insetoide, no entanto, que recebe mais enfoque: ao longo da história ele evolui, não apenas psicologicamente, mas fisicamente. Ele nutre um profundo ódio por aqueles que escravizaram e mataram seu povo, e este sentimento faz com que ele seja um dos membros mais valiosos do bando de Hulk. No entanto, quando a guerra acaba e Hulk finalmente traz a paz a Saakar, Miek quer continuar lutando, e isso trará sérios problemas para o Verdão.

Embora seja um vilão unidimensional - seu passado e motivações não são abordados com profundidade pelo roteiro - o Rei Vermelho, principal inimigo de Hulk em Planeta Hulk, cumpre bem o seu propósito na trama. Como qualquer imperador, ele é egocêntrico e se enxerga como o salvador do povo, embora não pense duas vezes em bombardear vilas e liberar vírus mortais em suas cidades apenas para destruir um inimigo que o humilhou publicamente. Além disso, ele é um lutador muito habilidoso, e conta com uma armadura hi-tech que o possibilita lutar quase que de igual para igual contra o Cicatriz Verde.

Rei Vermelho

Caiera, a Fortaleza
, é a principal guarda-costas do Rei Vermelho, e uma guerreira nata. Ela comanda as tropas do imperador em sua caçada pelo bando do Hulk, quando eles finalmente conseguem se livrar dos dispositivos que os obrigam a obedecer às ordens imperiais. Mas quando ela testemunha a crueldade de seu soberano, contrapondo-a com a honra e preocupação com o bem estar do povo de Saakar demonstrada por Hulk, a assassina acaba passando para o lado dos gladiadores, chegando a ter um relacionamento amoroso com o Verdão.

Outros adversários do Golias Esmeralda são os ferobôs, criaturas cibernéticas selvagens que vivem nas florestas de Saakar; a guarda da caveira, soldados robóticos que são um cruzamento de stormtroopers com o alien Predador, que atuam como guarda de elite do imperador; e os parasitas espaciais conhecidos como Espinhos, que infectam todas as formas de vida que tocam, transformando-as instantaneamente em monstros disformes. Por fim, esta saga conta ainda com a participação especial do Surfista Prateado, que surge num primeiro momento como antagonista do Hulk, mas que depois funciona como peça fundamental na rebelião dos gladiadores.

Hulk vs Surfista Prateado

Mesmo para aqueles fãs de quadrinhos que, assim como eu, não têm o Hulk entre seus personagens favoritos da nona arte, Planeta Hulk pode ser uma grata surpresa. Comecei a ler este encadernado mais por obrigação, mas terminei gostando muito da história. O enredo é simples e previsível, e isso não é de todo um defeito quando se está apenas atrás de uma boa história, e a arte é excelente, repleta de painéis muito bem desenhados e com cores vibrantes.

Planeta Hulk foi publicada em The Incredible Hulk #93-105, e Giant Size Hulk #1, entre 2006 e 2007, e rendeu uma sequência: Hulk Contra o Mundo, que mostra o retorno de Hulk à Terra para se vingar daqueles que o baniram. Aqui no Brasil Planeta Hulk saiu na coleção de Graphic Novels da Marvel pela Salvat, em dois encadernados, e em um belíssimo encadernado de luxo pela Panini. Também já foi adaptado para um filme animado em 2010, e diversos elementos de sua história irão aparecer no filme Thor: Ragnarok, o terceiro da franquia Thor. Mais um motivo para conferir esta excelente HQ!

Boa leitura!

Capa do Encadernado Lançado pela Panini

sexta-feira, 12 de maio de 2017

O filme pode até ser ruim, mas as miniaturas são sensacionais!

A Trindade da Justiça

Apesar de não ser um dos meus filmes de super-heróis favoritos, é inegável que a concepção visual de Batman vs Superman: A Origem da Justiça é espetacular. Os uniformes dos personagens, as cenas de luta, os cenários - tudo é muito bem feito e repleto de referências ao material fonte. Seguindo o lançamento do filme, a Iron Studios, empresa 100% brasileira que fabrica e comercializa figuras colecionáveis baseadas na cultura nerd, lançou uma coleção de estatuetas dos personagens principais da trama estrelada por Ben Affleck, Henry Cavill e Gal Gadot. O nível de detalhamento dessas figuras é incrível, prova da qualidade do profissionais da Iron Studios. As estatuetas são feitas de polystone, um composto de poliuretano que simula a aparência de pedra, como uma estátua de verdade, e são pintadas a mão. Além disso, cada uma vem acompanhada por uma base pentagonal, com a sulhueta e o nome do personagem gravados na parte inferior, além do logo do fabricante. 

O único ponto que deixa a desejar é o preço, como não poderia deixar de ser no Brasil. O preço original já é alto (algo em torno de R$ 300,00 a 350,00), e para piorar as lojas que comercializam as peças metem a mão, chegado a cobrar mais que o dobro do preço de lançamento. Ainda assim, como colecionador (ou viciado) que sou, pesquisei bastante e consegui adquirir algumas miniaturas que me agradaram mais. E são estes exemplares que vou mostrar nesta postagem.

Mulher Maravilha (Frente)

Mulher Maravilha (costas)

Mulher Maravilha (Detalhe do Laço e Espada)

A estatueta da Mulher Maravilha é a mais bonita da coleção. O uniforme, o escudo, a espada (cuja lâmina é de encaixe, sendo, portanto, um adereço removível), o Laço da Verdade, os braceletes, são idênticos ao que é retratado no filme, inclusive os tons de cor. A única ressalva é quanto ao rosto de Diana, que não está muito parecido com o de Gal Gadot. Tirando isso, a miniatura é perfeita. 

Superman (frente)

A miniatura do Superman também está idêntica à caracterização vista no filme, inclusive as feições de Henry Cavill, reproduzidas à perfeição. Os detalhes do belíssimo uniforme desenvolvido por James Acheson e Michael Wilkinson para o filme O Homem de Aço estão todos lá, inclusive as "escamas" que percorrem toda a área da vestimenta. 

Batman de Armadura (frente)

Batman de Armadura (Detalhe do Rosto)

Minha primeira estatueta! Batman com a famosa armadura inspirada naquela usada por Batman na minissérie O Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller. Idêntica à do filme, a armadura ainda conta com os arranhões sofridos durante a batalha entre o Cruzado de Capa e o Último Filho de Kripton. O rosto por baixo do capacete é igualzinho ao de Ben Affleck, até mesmo com a barba por fazer. Só não gostei da capa, pois os idealizadores da estatueta resolveram usar uma capa de pano mesmo, ao contrário da miniatura do Superman, cuja capa de de plástico. A capa do Batman é surrada e passa um aspecto de sujeira, mas por ser de pano, me pergunto se ela não acumula mais poeira (e ácaros) e com certeza sua durabilidade é menor. 

Batman (frente)

Batman (lado)

Batman (Detalhe da Máscara de Mergulho)

Minha mais nova aquisição, esta estatueta representa o Batman como visto em Esquadrão Suicida, nas cenas em que ele captura o Pistoleiro e quando ele persegue o Coringa e a Arlequina. É uma miniatura imponente, mostrando o Batman em seu traje de combate convencional, também inspirado no uniforme usado pelo personagem em O Cavaleiro das Trevas. Nesta miniatura o Morcego está utilizando sua pistola que dispara o bat-cabo, enquanto segura a capa - que graças a Deus desta vez é feita de plástico mesmo. Por baixo do capuz podem ser acrescentadas duas opções de rosto: uma com o rosto de Ben Affleck, novamente representado à perfeição, e outra com a máscara de mergulho utilizada por ele quando precisa lutar embaixo d'água. 

É isso aí, espero que essa postagem tenha sido útil. Lembrando que, caso você tenha ficado interessado por algumas dessas belezinhas, ainda há exemplares disponíveis em várias lojas do segmento. Me despeço com essa foto mostrando os dois maiores heróis do mundo se encarando, prontos para o combate! Até mais!

BvS


terça-feira, 9 de maio de 2017

RESENHA | A Torre Negra, Livro 3: As Terras Devastadas


As Terras Devastadas é o terceiro volume de A Torre Negra, série antológica do aclamado escritor norte-americano Stephen King. Famoso por escrever livros de suspense e terror, como Carrie, O Iluminado e It, A Coisa, King mostra toda sua versatilidade ao se aventurar nas misteriosas paragens do Mundo Médio, onde fantasia e ficção científica se confundem em meio à jornada de Roland Dechain, o Último Pistoleiro, e seus companheiros rumo à mítica Torre Negra, nexo de todo o tempo e espaço.

No primeiro volume, intitulado O Pistoleiro, acompanhamos a perseguição de Roland ao enigmático Homem de Preto, conhecemos um pouco de seu passado no extinto reino de Gilead, e também aprendemos uma lição muito importante, a mais importante que há para saber sobre o pistoleiro: ele não deixará nada nem ninguém ficar entre ele e sua preciosa Torre. Essa lição é aprendida da forma mais trágica possível, quando Roland é obrigado a escolher entre a vida do menino Jake Chambers e a Torre Negra. Roland escolhe a Torre, obviamente, sacrificando a vida de seu filho simbólico, tal como Abraão fizera com Isaque. Ao morrer pela segunda vez (a entrada de Jake no Mundo Médio se dera através de sua morte na Nova York do nosso mundo), o garoto profere as palavras que viriam a ditar o tom da próxima fase da aventura do pistoleiro:


"Vá então, há outros mundos além deste!" 

Na fronteira do seu mundo conhecido, Roland se depara com três portas que se abrem para a Nova York do nosso mundo, cada uma para uma diferente época. Assim começa A Escolha dos Três, segundo volume da série, que trata do recrutamento do ka-tet de Roland, aqueles que estavam predestinados a compartilhar seu destino: Eddie Dean, um viciado em heroína da década de 80; e Susannah Holmes, uma ativista dos direitos dos negros paraplégica da década de 60, a qual também sofre de um distúrbio mental que a faz alternar entre duas personalidades completamente opostas entre si. O terceiro indivíduo que Roland deveria recrutar era Jack Mort, um psicopata que já havia cruzado os caminhos de Jake e Susannah, mas devido à sua natureza maligna Roland o deixou para morrer nos mesmos trilhos do trem que amputara as pernas de Susannah. Este ato, contudo, teve lá suas consequências, pois, com a morte de Mort (o trocadilho foi inevitável), quem seria o terceiro integrante da equipe de Roland? É esta pergunta que este terceiro volume se propõe a resolver, entre outras questões.

As Terras Devastadas começa com Roland e seu ka-tet tentando descobrir uma forma de encontrar Jake e levá-lo para o Mundo Médio. O leitor poderia então se perguntar: "Ué, mas Jake nao havia morrido no primeiro livro?" A resposta é sim, e não! Confuso? Calma que eu explico: Roland matara Jack Mort antes dele assassinar Jake no nosso mundo, e isso acabou criando um bizarro paradoxo temporal, no qual o menino estava vivo (e assim contrariando os eventos de O Pistoleiro) e morto ao mesmo tempo. Agora imagine uma pessoa que está viva, mas cuja mente tenta a todo custo se convencer de que está morta. Esta é a situação de Jake, e a única forma de corrigir este problema é levando-o para o mundo de Roland. Esta travessia é feita no melhor estilo Stephen King, que invoca seus talentos como escritor de histórias de terror para levar os nervos do leitor ao limite, utilizando um recurso que ele já havia usado em It, A Coisa, e que aqui funciona igualmente bem: uma Casa Mal Assombrada. No caso de Jake, porém, seu problema não está no que reside dentro da Mansão, e sim na Mansão propriamente dita. A passagem que narra o retorno de Jake ao Mundo Médio é uma das mais emocionantes e tensas de toda a série, e é também a origem de um dos maiores problemas de Roland; este desdobramento, entretanto, fica para outra resenha.

A Passagem de Jake

Além do retorno de Jake, King finalmente decide fornecer para seus ávidos leitores um pouco mais de informação sobre a Torre Negra. A mais importante delas é sobre os Feixes de Luz, que são doze feixes de energia que sustentam a Torre Negra e que se conectam com os Doze Portais, cada um deles protegido por um dos Doze Guardiões. Como estão ligados à Torre, estes feixes oferecem um caminho, um ponto de partida para a jornada em direção à Torre Negra, que finalmente tem seu início no portal do Urso, após Roland e seu ka-tet derrotarem o gigantesco urso ciborgue Shardik. Eles iniciam a viagem a partir do portal do Urso em direção ao portal da Tartaruga, e aqui é importante ressaltar a associação que King faz com a grande tartaruga que aparece no final de It, A Coisa, pois, como já foi mencionado na resenha de O Pistoleiro, esta série de livros trás diversas menções e referências a elementos de outras obras do autor, estabelecendo uma espécie de "Universo Compartilhado Stephen King".

Ainda sobre os Feixes de Luz, a tecnologia da qual eles são feitos foi criada pelos habitantes originais do mundo de Roland, chamados Grandes Anciões. Apesar do nome pomposo, todos os sinais deixam claro que estes "seres superiores" eram na verdade seres humanos comuns, porém dotados de um amplo conhecimento tecnológico, que muitas vezes é confundido com magia. Assim como a nossa, a civilização desses Grandes Anciões rumou para um holocausto nuclear, ou algo bem pior do que isso (se é que é possível existir algo pior do que um apocalipse nuclear), mergulhando o mundo de Roland em uma Idade das Trevas sem fim, e transformando-o na terra devastada de que fala o título. Durante todo o livro o autor explicita essa grande mudança pela qual passou o Mundo Médio, seja pelo fato de nenhum relógio funcionar direito naquele mundo, ou por simples abelhas não serem mais capazes de construir uma colmeia. Além disso, as "Terras Devastadas" não podem ser entendidas apenas no sentido literal da expressão: seu significado também abrange as pessoas que vivem nessas terras, a maioria velhos e velhas sem qualquer esperança no mundo em que vivem, cercados por anarquia, maldade e tragédias. No entanto, é nas ruínas da cidade de Lud - e na desolação que jaz além desta - que o ka-tet de Roland finalmente compreende a extensão da desolação que é o mundo de Roland, e o real significado da expressão "o mundo seguiu adiante".

A Torre, os Feixes de Luz e os Doze Portais

Stephen King faz um excelente trabalho no quesito desenvolvimento de personagens. É clara a evolução de Eddie e Susannah entre os segundo e o terceiro livros. Eddie, já livre da influência da heroína, da qual era prisioneiro, agora precisa lidar com outro tipo de grilhão: a sombra representada pelo finado Henry, seu irmão mais velho, o qual dedicara toda sua vida a sabotar Eddie, de forma a disfarçar sua própria inaptidão. Os constantes abusos e humilhações deixaram sequelas na personalidade de Eddie, que tornou-se incapaz de reconhecer seu próprio valor. Mas a busca pela Torre não permite dúvidas, e é o amor de Susannah que possibilita o nova-iorquino a superar este obstáculo. Já Susannah, que representa a síntese de suas outras duas personalidades - Odetta Holmes e Detta Walker -, mostra-se cada vez mais uma mulher ímpar ao conseguir usar com sabedoria os melhores atributos de cada uma: a ternura e compaixão de Odetta, e, quando preciso, a tenacidade de Detta.

Roland, por sua vez, precisa reaprender a ter amigos. É sabido que ele já fez parte de outro ka-tet, formado por seus amigos da infância, e que em algum momento de sua busca pela Torre eles foram mortos. Agora ele precisa transformar Eddie e Susannah em pistoleiros, e os dois parecem ter nascido para o ofício. Mas enquanto Susannah demonstra ser uma aluna promissora, é com Eddie, e sua aparente incapacidade de levar as coisas a sério, que Roland tem mais problemas. Quanto a Jake, o menino enxerga Roland como um pai substituto, e não parece guardar mágoas por ter sido abandonado no passado, principalmente depois que Roland recebe a chance de se redimir por este pecado. Há ainda um quinto personagem que se junta ao ka-tet de Roland, antes da chegada a Lud: o mascote Oi. Oi é um zé-trapalhão, uma mistura de cachorro com guaxinim dotado de uma pequena dose de inteligência, a qual, aliada a um profundo afeto por Jake, lhe permite realizar os feitos mais heroicos. Ele é o responsável pelas cenas mais engraçadas e também pelas mais emocionantes do livro, e sem dúvida merece o título de personagem mais carismático da trama.

Jake e Oi

No que diz respeito a vilões, As Terras Devastadas não deixa a desejar. Em Lud somos apresentados a Gasher e ao Homem do Tique-Taque, que conseguem fazer com que o leitor tenha medo pela vida dos protagonistas, uma vez que são personagens completamente imprevisíveis e sem qualquer escrúpulo. Além destes há também a aparição de uma misteriosa entidade, um homem apelidado de Estranho Sem Idade, alguém sobre o qual o Homem de Preto alertara Roland. Este indivíduo, que aparentemente possui poderes mágicos, guarda uma certa semelhança com o principal antagonista do livro A Dança da Morte, também de King. Mas quem rouba a cena mesmo é a inteligência artificial encarnada na forma de um trem de monotrilho chamado Blaine. Ardiloso, insuportavelmente convencido e com tendências suicidas, este peculiar personagem é uma mistura de HAL 9000 com o dragão Smaug e Gollum. Blaine. Ele representa a única esperança de Roland de alcançar a Torre e também sua maior ameaça, já que sua compulsão charadas do tipo "O que é o que é?" o levará a fazer de tudo para participar de uma última competição de enigmas antes de finalmente atingir a "clareira no final do caminho".

Personagens bem construídos, uma boa ambientação, focada na mitologia em torno dos Feixes de Luz e da Torre Negra, cenas de ação frenéticas e bem orquestradas, e vilões realmente ameaçadores fazem de As Terras Devastadas o melhor livro da série A Torre Negra até agora. Se este livro tem um defeito, é o seu final. Não que seja um final ruim, até porque, não há um final. Stephen King proporcionou um dos cliffhangers mais angustiantes do mundo da literatura, quando resolveu encerrar o livro bem quando a competição de enigmas tem seu início. A diferença de tempo entre o lançamento do terceiro e do quarto volumes foi de 6 anos, então imagino a angústia dos leitores d'A Torre Negra que tiveram que esperar todos este tempo para saber como Roland e seu ka-tet escaparam da morte certa. Como todos os livros desta série já foram publicados, então os novos leitores não precisarão passar por isso, o que ameniza um pouco esta decisão do escritor.

Para esta resenha utilizei a edição publicada pela editora Suma de Letras, cuja capa encabeça esta postagem, e encontra-se disponível nas principais livrarias do país em versão física e digital. Boa leitura, e até a próxima resenha!

sexta-feira, 5 de maio de 2017

RESENHA | Mulher Maravilha: Desafio dos Deuses


Dando sequência à publicação da fase de George Pérez à frente da revista da Mulher Maravilha, a Panini Comics lança em terras tupiniquins a revista Lendas dos Universo DC: Mulher Maravilha por George Pérez Vol.2, um encadernado em capa cartão e papel offset que reúne as edições 8-14 da revista Mulher Maravilha Vol. 2, de 1987, compreendendo uma saga pouco conhecida pelos fãs mais jovens da amazona, mas que figura entre os melhores trabalhos do artista em parceria com o roteirista Len Wein. Desafio dos Deuses, além de reintroduzir uma importante vilã da Mulher Maravilha, traz respostas para algumas das perguntas que haviam ficado no ar em Deuses e Mortais, como por exemplo de onde viera a pistola que as amazonas usaram no teste de Diana, e o que havia de tão perigoso por trás da porta de aço dentro da caverna na Ilha Paraíso.

A história começa logo após a conclusão da batalha contra Ares. A edição 8 serve de ligação entre estes eventos e o restante do Universo DC, fazendo menção à saga Lendas, na qual a heroína teve seu primeiro encontro com os membros da Liga da Justiça. A primeira coisa que se nota nesta edição é que os autores fogem do modelo convencional de quadrinhos ao optarem por narrar estes eventos na forma de texto em prosa, sob a perspectiva das quatro principais personagens femininas que dão apoio à Diana no mundo do patriarcado: a professora Julia Kapatelis, a tenente da Força Aérea Americana Etta Candy, a jovem Vanessa Kapatelis, e a publicitária Myndi Mayer. Assim como no arco anterior, Pérez e Wein buscam estabelecer a Mulher Maravilha no mundo real, e para tanto mostram-na se encontrando com figuras como o presidente Ronald Reagan e até com eles próprios, numa divertida quebra da quarta parede. Esta edição também aborda alguns assuntos sérios: machismo e intolerância religiosa são apenas algumas das reações exibidas pelos líderes mundiais em resposta ao surgimento de uma heroína cuja missão é transmitir ao mundo uma mensagem de paz.

A Nova Mulher Leopardo

A edição seguinte mostra a estreia da nova Mulher Leopardo. A vilã, que durante as Eras de Ouro e de Prata dos quadrinhos era representada como uma mulher normal em uma fantasia de leopardo, desta vez se torna literalmente um híbrido humano/felino após um ritual místico realizado em homenagem a um deus planta. Sua nova identidade é Barbara Ann Minerva, uma arqueóloga britânica cuja maior obsessão é se apossar do Laço da Verdade de Diana. Muito mais violenta e sanguinária do que suas versões anteriores, ela se mostra uma oponente capaz de rivalizar com os poderes da Mulher Maravilha, mas infelizmente a batalha entre estas duas grandes inimigas acaba terminando sem uma conclusão, e a Mulher Leopardo não volta a dar as caras neste encadernado.

O famigerado Desafio dos Deuses tem início logo após Diana retornar para Themyscira, após terminado o prazo de seu período no chamado "mundo do patriarcado". No arco anterior Pérez já havia deixado claro que a incursão da Princesa Diana no nosso mundo ainda não era definitiva, e que ela precisaria retornar à sua ilha natal, uma vez que conseguira realizar a impossível tarefa de derrotar o deus Ares. Além disso, as decepções sofridas pela amazona diante da desconfiança e preconceito do restante do mundo em relação aos seus poderes, e da inesperada oposição aos seus ideais de paz só fizeram aumentar sua vontade de voltar para Themyscira. Era preciso, então fornecer as circunstâncias necessárias para fazê-la decidir voltar ao mundo do patriarcado e se tornrar a heroína que todos conhecemos. Estas circunstâncias vêm na forma de um desafio mortal proposto pelos Deuses do Olimpo, do qual dependia a sobrevivência das amazonas.

Mais importante do que os desafios encarados pela heroína nas profundezas subterrâneas da Ilha Paraíso, é o motivo pelo qual ela foi obrigada a enfrentar estas provas. Tudo começa quando Zeus, influenciado pelo sátiro Pan, desce à Terra e  propõe que a Princesa das Amazonas se deite com ele, como prêmio por ela ter derrotado Ares. Não somente isso, ele deseja transformar o reino das amazonas em seu harém pessoal! Repare que os autores repetem a fórmula da eterna luta da mulher contra a dominação masculina, já abordada no arco anterior, apenas substituindo o semideus Héracles, que escravizara e estuprara as amazonas no passado, por seu pai, Zeus.

Zeus Assedia Diana

Mais uma vez George Pérez utiliza o arsenal de personagens da Mitologia Grega, de modo que, em muitos momentos, mais parece que estamos lendo um dos relatos do período clássico ao invés de uma história em quadrinhos. No entanto, se testemunhar a Mulher Maravilha, trajada com seu formidável traje de guerra, travando batalhas épicas contra criaturas como a Equidna, Hidra, Ciclope, Quimera, Minotauro ou o abominável Coto garantem uma excelente diversão, algumas decisões de roteiro deixam a desejar, embora não sejam de total responsabilidade do roteirista. A insistência das grandes editoras em obrigar suas equipes criativas a interromper um planejamento de meses a fim de que possam se envolver nos famosos crossovers (sagas enormes que interligam diversas revistas da editora) acabam tornando algumas histórias confusas e prejudicando o andamento de sagas que poderiam ter sido muito melhores sem essas intromissões. No caso de Desafio dos Deuses, o impacto da saga Millennium no curso geral da história é pequeno, mas a trama envolvendo a verdadeira identidade de Pan acaba sendo broxante e sem sentido, justamente por não ter nada a ver com o enredo desenvolvido até então por George Pérez e Len Wein.

Ainda assim, considero o saldo desta história bastante positivo. O ponto mais alto do enredo se dá na edição 13, intitulada Ecos do Passado, na qual Pérez explica de forma bastante plausível a relação do uniforme da Mulher Maravilha com a bandeira norte-americana, revelando a verdadeira natureza da relação de Diana com o coronel Steve Trevor. Esta relação, contudo, não é de natureza amorosa, tal como era na versão pré-Crise, pois, como visto no final deste arco, Steve começa a namorar Etta Candy, após ela finalmente se declarar para ele.

Mulher Maravilha Enfrenta a Hidra

Desafio dos Deuses é um épico em diversos sentidos: é a história de coragem e determinação de uma heroína que faz de tudo para salvar seu povo, e que no meio do caminho acaba encontrando as respostas sobre qual a sua verdadeira missão no mundo; é também a história de uma rainha e mãe que, diante da decepção com suas divindades - pelas atitudes de Zeus e pela impotência de suas deusas ante os caprichos do deus - se volta contra elas para proteger sua única filha, mesmo que isso signifique ir contra suas próprias irmãs em armas; e é também uma história de redenção, quando um ciclo de ódio entre homens e mulheres é finalmente interrompido, não pela violência, mas através do perdão e do amor.

Esta é a história que George Pérez desejava contar sobre a Mulher Maravilha desde que fora convidado para guiar a reformulação da heroína após o reboot, mas que não podia sem antes apresentar a nova origem da personagem. Embora eu considere Deuses e Mortais melhor que sua sequência, ainda assim Desafio é uma grande HQ, tanto pelo excelente roteiro como pela arte magistral de Pérez, que  se tornou referência para todos aqueles que viriam a trabalhar nas histórias da maior heroína de todos os tempos.

Boa leitura!

Capa do Vol. 2 de Lendas do Universo DC